O marceneiro das palavras
Trabalhei durante muitos anos com meu pai, auxiliando-o na sua
marcenaria. Acompanhava a madeira bruta sendo aplainada, ficando quase lisa.
Depois era lixada, cortada, pregada, parafusada, até receber alguns detalhes que
transformava tudo em um móvel de cozinha ou de um quarto. Ajudava em algumas
partes desse processo, mas era passar selador, lixar e dar a segunda
mão do mesmo produto a minha principal função. Às vezes, envernizava. Era o
processo final. Trabalho meticuloso e manual, do qual não sou muito bom, mas que
me enchia de orgulho quando via pronto. Bastava a aprovação do cliente e elogio
pelo trabalho bem feito, ou a crítica por algo que não ficou do seu agrado. Ou
simplesmente o pagamento e o silêncio.
O processo da escrita não é diferente. A madeira é a
palavra, que nas mãos do escritor é aplainada, lixada, cortada, pregada e
parafusada, necessitando muitas vezes de dobradiças para articular suas partes.
Depois de tudo quase pronto, a releitura é necessária para dar o brilho, que só vai se
completar com uma terceira, quarta, quinta leitura, depois de cuidadosamente
polir as palavras. Completado o trabalho, em que mãos e dedos martelaram o
teclado, vem o orgulho da realização. Basta o elogio do leitor ou sua crítica.
Ou o silêncio.
Comentários
Ótimo texto, psor! Não imaginava que chegou a trabalhar em marcenaria. Realmente, é um trabalho BEM meticuloso.