Traçando livros de hoje: "Um best-seller do ateísmo"
http://www.grupogaz.com.br/gazetadosul/noticia/435184-um_best_seller_do_ateismo/edicao:2014-03-05.html
Um best-seller do ateísmo
Um best-seller do ateísmo
Frequentemente me
perguntam: “como você se tornou ateu?” Respondo que não me tornei. Eu nasci
ateu, mas a família e a sociedade me fizeram ser cristão. Voltei (esse é o
verbo correto) a ser ateu na época da universidade, mas não por causa dela.
Foram as leituras de literatura e filosofia que me fizeram questionar as
verdades que carregava comigo e me fizeram ver o que não via, mas já
desconfiava. Ler toda a Bíblia também me pôs a semente da dúvida, pois aqueles
textos ditos sagrados, repletos de contradições e fantasias, não poderiam ser
considerados a verdade para guiar a vida de ninguém. Com algumas recaídas (na
minha monografia de conclusão do curso de Letras agradeci a esse ser imaginário
chamado “Deus”), assumi minha posição de ateu há mais de dez anos. Nesse tempo,
tive contato com a obra de autores que serviram para reforçar meus argumentos.
Entre eles, está Daniel C. Dennett.
O filósofo faz parte
de um grupo de intelectuais chamado “4 cavaleiros do ateísmo”. Ele, Richard
Dawkins, Sam Harris e Cristopher Hitchens, já falecido, escreveram best-sellers
contestando a existência de divindades e criticando fortemente as religiões,
além de participarem ativamente de debates públicos. São odiados pelos crentes
do mundo todo, principalmente pelos criacionistas.
Quebrando o
encanto – a religião como fenômeno natural (Globo Livros, tradução de Helena Londres) foi lançado
no EUA em 2006 e no mesmo ano no Brasil. Como as idéias são criadas pela mente
é o ponto central do livro. Porque deixamos a religião se tornar uma espécie de
parasita que nos invade o cérebro? Para chegar a essa resposta, Dennett procura
definir o termo religião, sua essência, as crenças (principalmente as
monoteístas), tentando aprender o máximo possível sobre elas, para então
“quebrar o encanto”: mostrar que as pessoas vivem uma ilusão que consola.
O estilo de Dennett
no livro é, em alguns momentos, tedioso, devido a idas e voltas num mesmo
argumento ou afirmação, como repetir várias vezes nos primeiros capítulos que
devemos estudar cientificamente as religiões e que elas têm seu lado bom e lado
ruim. Na verdade, o autor, me parece, ironiza a tática dos religiosos que
repetem ad nauseam seus ensinamentos,
fazendo com que uma verdade seja incutida na mente do fiel. Dennett vai além,
pois seus “volteios” filosóficos e relativizações servem para, nos capítulos
seguintes, fazer jus ao título do livro. Se ele não consegue quebrar o encanto,
pelo menos consegue uma leve rachadura.
Por que
ateus como Dennett se preocupam tanto com as religiões? Pegando o meu caso como
exemplo, elas ocuparam boa porção de tempo da minha infância e adolescência. Na
idade adulta, continuam invadindo minha privacidade, minha “timeline” nas redes
sociais da internet (“quem acredita em Deus compartilha, quem não acredita só
olhe”), a porta da minha casa (“tem um minuto para Jesus?”) ou até entram
dentro dela (“você aí no sofá, levante-se e ponha um copo de água ao lado de
sua televisão”), os lugares onde trabalho, as decisões governamentais, etc.
Sinto-me, portanto, no direito de opinar sobre elas, afinal, se não as sigo, se
digo que não acredito em um ser superior, sou considerado uma pessoa
insensível, sem coração e culpada pelos males do mundo. Não posso ignorá-las
porque as pessoas fazem questão que não as ignore. Então, se sou questionado,
por que não posso questionar? Daniel C. Dennett, no papel de filósofo, faz
isso, questionar.
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