Conservadores querem mudanças
No Brasil, os
conservadores querem mudanças, enquanto os ditos revolucionários querem deixar
tudo como está. Ora, vivemos (ou vivíamos) no melhor dos mundos possíveis,
afirma o Pangloss das redes sociais, que vive na pobreza há muitos anos, não é
de agora, pulando de um emprego a outro (quando consegue um), morando de favor
ou de aluguel em moradias precárias e mesmo assim grita que lhe tiraram o seu
melhor mundo possível e que ainda querem lhe tirar mais. Não passa o óbvio pela
cabeça do Pangloss, que o que ele tem (ou tinha) não é direito, mas sim
migalhas que lhe servem (ou serviam), como isca, como aqueles cachorros de
corrida que saem atrás de uma lebre mecânica.
Há também o Pangloss
da rede social, que estende seus tentáculos paras as salas de aulas, tanto do
ensino básico quanto do ensino superior, acha que ele está certo, que está
defendendo aqueles que necessitam, mesmo que aqueles que necessitam não
concordem com que ele pensa. É aquele sujeito cheio da grana, que conseguiu
bons empregos, que “cresceu” na vida e que depois viu a fonte para os seus
projetos secar, pois o dinheiro não cai do céu, mas sim de raspagens de cofres
públicos, de acúmulos de dívidas que levaram a fonte a uma crise econômica. O
novo responsável pela fonte fechou a torneira e por isso não merece estar onde
está, mesmo que ele esteja fazendo os reparos para a fonte voltar a jorrar.
Ora, se o pobre que nunca se beneficiou da fonte dele não pensa como ele, esse
pobre é burro, é manipulado, é o idiota útil que não vê que está precisando da
verdade que ele Pangloss detém: de que vivíamos no melhor dos mundos possíveis
e que de uma hora para outra, como num passe de mágica, tudo virou contra o
pobre. Por que só agora a revolta e por que a crítica contra quem antes se
revoltou?
Quem estava nas ruas
na greve do dia 28 de abril (que, diga-se, fui obrigado a fazer porque meus colegas professores
decidiram parar)? Quem está fora da bolha viu funcionários públicos,
estudantes, sindicalistas e militantes partidários. E muitos baderneiros. O
Brasil não é formado apenas por essas pessoas. O comércio estava funcionando,
as empresas estavam em pleno funcionamento. A maioria da população estava
trabalhando. Muitos gostariam de parar, mas não há leis que as amparem. Aliás,
os funcionários públicos lutam para manter privilégios que a maioria da
população não tem. Os sindicatos lutam para manter a grana que entra nos cofres
e pelo direito de não trabalhar para poder protestar. Os estudantes têm a
rebeldia no sangue e são motivados a ir às ruas por ser do contra e pronto (e
para alguns matar aula é a motivação). Os militantes partidários, por seu
turno, saíram às ruas preocupados em trazer de volta o poder para suas mãos.
A maioria da população
estava trabalhando, porque precisa se sustentar. Muitos não são empregados dos
“terríveis patrões”, são empreendedores também: o pedreiro que trabalha por
hora e não tem seu dinheiro garantido se parar; o barbeiro ou a cabeleira que conta
com o dinheiro que pinga dia sim, dia não no seu caixa; a diarista que trabalha
em diferentes casas e não recebe se não trabalha; o jardineiro, pois justamente
na sexta é o dia em que tem mais serviço e não pode parar; a lista é enorme.
Como disse um aluno
que acha o máximo ter um parente próximo na cadeia e exalta a vida da
bandidagem, devo ficar no meu mundinho dos livros e deixar as ruas pra ele, que
não entendo nada nas ruas, mesmo que eu já tivesse tido um passado nelas. Ou um
colega professor que acha um alívio eu dizer que não entendo nada de política,
pois não penso como ele. Sim, prefiro ficar na minha biblioteca, lendo e
observando o mundo da minha maneira, do que seguir a matilha, a manada, a massa
que não pensa por si próprio e apenas reproduz palavras de ordem achando que
com isso vai salvar o mundo. Na verdade quer salvar o seu mundo.
Eu vivia dentro dessa
bolha, mas finalmente saí dela. Entrei em outra, é verdade, mas nessa bolha
tenho os meus livros, meus discos, meus filmes e nela eu sou o rei. Ninguém me
diz o que eu devo ou não fazer aqui (salvo minha esposa, mas rainha é rainha,
não é?). É o meu melhor mundo possível.
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