Júlio Nogueira retorna para dizer o que o fez abandonar uma leitura
Júlio Nogueira entra
em contato comigo nesta madrugada do dia 17 de junho para que eu publique uma
pequena crítica no blog. Voltou a dar aulas, mas continua refugiado numa
chácara no interior do RS, talvez próximo onde morou por um tempo o Belchior.
Contou que andou tentando escrever em um outro blog, dessa vez com um
pseudônimo, mas não deu muito certo. Havia publicado este texto por lá. “Acho
que no teu blog haverá mais leituras”, ele diz, ingenuamente.
Um livro que tentei ler dessa nova geração de escritores que
desponta nas redes sociais (e sabe lidar muito bem com ela, diga-se) foi Jantar Secreto, de Raphael Montes,
editado pela Companhia das Letras, uma editora com uma capacidade enorme de dar
um ar de sofisticação para algumas porcarias. Espero sinceramente ter começado
com o romance errado a conhecer o jovem escritor, porque a primeira impressão
não foi nada boa nas primeiras páginas da obra. Sim, não fui adiante na
leitura, e olha que costumo ler até o fim livros ruins.
O mote é muito bom, e foi isso que me atraiu a adquirir o
livro (na verdade o e-book). Um grupo de amigos e estudantes vindo do interior
e que precisa de grana para pagar o apartamento onde mora no Rio de Janeiro,
além de algumas dívidas, passa a lucrar com a venda de jantares especiais e
secretos com um número restrito de clientes com vontade (e possibilidade,
lógico) de gastar milhares de reais em um prato diferenciado: carne humana.
Os personagens, no entanto, me pareceram adolescentes
demais, apesar de já serem estudantes universitários. Um personagem nerd, gordo, meio vagabundo, um “hacker”
chamado Leitão, com um comportamento muito infantil, é quem dá a ideia dos
jantares. O narrador, chamado Dante (uma das tentativas frustradas de Montes
para borrifar erudição no enredo), mais Miguel e Hugo (o cozinheiro, digo, chef) completam o grupo de estereótipos
forçados: o gay, o “certinho” e o vaidoso, respectivamente. Há ainda uma
prostituta, Cora, que se torna amiga deles, depois de ser contratada para tirar
a virgindade do amigo gordo.
O que me fez largar o livro sem nem chegar a página 100 foi
um ridículo plano de roubar um cadáver no hospital e as reproduções da conversa
entre eles num capítulo chamado “[Grupo do WatsApp]”. Reproduzo aqui uma imagem
de parte da conversa que encontrei na internet, pois não sou bom nisso de
capturar imagens e postar:
Tenho esse aplicativo por obrigação profissional (e minha patroa
me obrigou também, claro) e tenho ojeriza dele. Nos grupos da escola onde
leciono, entram essas bobagens vez ou outra. Não esperava vê-lo numa obra
literária, ou que se pretende como tal. Há uma diferença entre literatura
policial e livros de entretenimento, que o pessoal meio deslumbrado não quer
enxergar. Raphael Montes pode ser mestre no segundo tipo, mas não do primeiro,
como apregoam.
Há momentos muitos bons, que mostram o potencial do
escritor, e que talvez por isso o coloquem no patamar que está hoje, sendo
roteirista da Globo, apresentando programa de literatura na TV Brasil e sendo
traduzido em alguns países. (Na capa há uma frase do jornal The Guardian que o compara a Hitchcock e
Tarantino! Menos, menos, por favor.) Este livro, repito, este livro, deixa a
desejar. E cá entre nós, o escritor posando de garçom com sangue na camisa na
quarta capa do livro é outra coisa ridícula.
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