Quero ser um professor de espanto
Texto saiu no Riovale Jornal
Gosto do pensamento
do escritor Rubem Alves. Ele é um provocador. Gosto de quem provoca, mas já me
flagrei criticando o que ele diz e escreve. Cheguei a prometer para mim mesmo
não o ler mais. Porém, se encontro um texto ou uma entrevista dele, o encanto é
imediato e começo a rever minhas ideias e meus conceitos. Ele é o professor que
eu gostaria de ser quando me formei na universidade. O dia a dia da sala de aula,
no entanto, acabou me reformando. Se o leio de novo, tento me deformar.
Para ele, o melhor professor
é o “professor de espanto”. É aquele que instiga o aluno a pensar e a buscar
conhecimento, não de uma forma autoritária, mas de uma forma encantatória. O
professor não dá respostas, que já estão nos livros e na internet, mas instiga a
curiosidade. Faz com que a criança e o adolescente não percam o espanto com o
mundo. “É o professor que não sabe nada”,
diz Rubem Alves em um documentário, “ele não precisa saber nada, ele não
precisa saber as respostas, mas ele fica espantado. A missão do professor seria
pegar os alunos e mostrar os espantos para eles. Por exemplo: o espanto da
mosca azul, o espanto dos caramujos, fazer as crianças pensarem. Ou quem sabe
não professor de espanto, cada professor devia ser um professor de espantos,
antes de serem professores que dão as respostas.”
Penso que o problema
que enfrentamos é quebrar o muro que há entre o mestre e o aluno. Parece,
muitas vezes, que jogamos para o outro lado uma garrafa contendo conhecimentos.
Não sabemos se o jovem a pegou e a abriu, mas achamos que fizemos a nossa parte
ao mandá-la. Até que pedimos a garrafa de volta, dessa vez contendo o que ele
aprendeu. Geralmente reproduz exatamente o conteúdo anterior. Depois retornamos
a garrafa com sua nota (numérica ou travestida em um conceito ou em um parecer).
E achamos que com isso ele aprendeu. Melhor seria dizer: ele apenas apreendeu.
Ensinar seria
quebrar esse muro abrindo uma passagem ou então derrubá-lo. Mostrar para o
aluno o que há de um lado, porém o professor deve ver também o que há no outro.
Para usar de um chavão que é válido ainda, porque não aplicado, devemos
construir pontes. “Quando um muro separa, uma ponte une”, escreveu Paulo César
Pinheiro, num outro contexto, mas que vem a bem a calhar neste. Penso que me
afasto dos alunos se eles se afastam de mim. Não deveria ser assim.
No mês de outubro,
há um dia da criança e outro do professor. Entre as duas datas há outros dois
dias separando. Gostaria que isso só acontecesse no calendário. Quero ser um
professor de espanto que vá ao encontro e não de encontro ao aluno. Quero que ele
se espante com o conhecimento e se aproxime de mim e não que se espante com
minha cara feia e fuja de mim.
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