Resenha sobre "Contraforte", de Rudinei Kopp



“Passas sem ver teu vigia...”

Rudinei Kopp é um escritor da minha cidade onde parece que, se chutar uma moita, surgem 20 escritores (ou metidos a, como é o meu caso). Temos Academia de Letras, Associação de escritores, Feira do Livro, editoras, lançamentos aos montes, jovens escrevendo e tal. Leitores, no entanto, são muito poucos. Ou pelo menos bons leitores. Já ouvi escritor (que deveria ser leitor) daqui (experiente) se vangloriando por ler 3 (três!) livros por mês. Sabe aquela história de que terra de colonização alemã é mais culta? Pura besteira.

O Rudinei, no entanto, vem desenvolvendo um projeto sério (e é bom leitor). Faz Literatura, com L maiúsculo, não escreve livros descuidados com a forma, conteúdo e linguagem como a maioria. Ele tem um apuro técnico invejável, como demonstrou nos dois primeiros romances, Rio dos dias e Oto e Isac, obras que tive a oportunidade de ler e resenhar.

Com Contraforte (Editoras Gazeta e Pradense, 135 páginas), Kopp completa uma trilogia, talvez involuntária, de personagens que lidam com algum tipo de arte. Na primeira obra, o protagonista é um desenhista e pintor; na segunda, havia um marceneiro, que fazia do trabalho com a madeira uma arte; agora, um estudante de Arquitetura, que abandona a faculdade por não poder quitar suas dívidas, trabalha de vigia num museu de artes e, por um acaso também relacionado à arte, é convidado para comentar, em programas veiculados na internet, os quadros que vigia.

O narrador-protagonista conhece uma jovem repórter, Ana, por quem logo se sente atraído, tal como os quadros também o atraíam. A beleza, portanto, é o mote, a beleza que tem seu quê de atraente. Essa atração, no entanto, pode não ser agradável. “A beleza corrompe tudo, faz pouco caso do orgulho, cria cúmplices, desengana a razão”, diz o vigia, que vigiava a beleza dos quadros e que agora vigia a beleza que passa nos corredores. Os versos do Chico Buarque vêm à mente: “Passas em exposição/ Passas sem ver teu vigia/ Catando a poesia/ Que entornas no chão”.

Em contraponto à beleza e à civilidade das obras expostas nos corredores do museu, o leitor se depara também na narrativa com o feio e a barbárie da cidade, a violência nas ruas, os corpos expostos nas calçadas como obras destinadas a serem “apreciadas” pelas pessoas. Quando esses dois mundos aparentemente (mas só aparentemente) distantes se encontram, o resultado pode não ser nada apreciável.

Contraforte, embora seja um bom livro, ainda é inferior ao primeiro, assim como o segundo não atingiu as expectativas. O enredo poderia ter se desenvolvido mais, o protagonista muda muito rápido (muda ou mostra seu verdadeiro eu?), Ana é uma personagem incompleta (obra de arte inacabada?) e outras pontas não são bem amarradas. Entendo que é uma tentativa de deixar “dados escondidos” (para usa uma expressão do Vargas Llosa) para o leitor completar as lacunas. Entretanto, o que me passou foi um sinal de cansaço do escritor, como se quisesse se ver livre de sua própria obra, cansaço talvez provocado por olhar o seu entorno e se perguntar: o que estou fazendo aqui? Por que ainda continuar escrevendo?

Te entendo, Rudinei. Te entendo muito bem.

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