Os humilhados serão mesmo exaltados?

 


 Meu texto no jornal Gazeta do Sul de hoje.


O verme se encolhe quando pisado. Uma atitude prudente. Diminui assim a probabilidade de ser pisado outra vez. Na linguagem da moral: humildade.” Diz Friedrich Nietzsche em “Crepúsculo dos ídolos”. É a atitude que nós, seres humanos, precisamos às vezes tomar. Encolho-me, muitas vezes, para não ser mais pisado, para sobreviver. Talvez não seja humildade isso. Não, não é. Essa moral é justamente o que o filósofo tenta destruir e não a quero mais para mim.

Deixei de ser humilde, afinal, mesmo o sendo por alguns momentos nessas quatro décadas de vida, os outros não me veem dessa forma. Já fui taxado de arrogante quando emiti, inclusive neste espaço do jornal, minhas opiniões nem sempre agradáveis às mentes acomodadas. Que o seja, então. Arrogo-me o direito de ser arrogante. Agora não me importam mais os outros.

“O que não me mata me torna mais forte”, escreve Nietzsche no livro citado. Aforismo que quase nunca é atribuído a ele. No “gauchês” (como nos lembra Marcelo Backes em um dos livros que mais releio, “Estilhaços: minigâncias, digressões e batocaços”), se diz: “o que não mata engorda”. Ser um super-homem, um além-do-homem, superar as minhas próprias fronteiras, eis o caminho que decidi seguir. Chega de ser humilhado, ridicularizado. Vou mostrar apenas aquilo no que sou bom e deixarei na penumbra aquilo que talvez não me contemple, apesar de me sustentar, pelo menos financeiramente. O que faço de melhor não me mantém, não mantém minha família, mas mantém minha dignidade, meu orgulho, me mantém de pé.

Sim, sou um verme, o verme machadiano que roeu as frias carnes de Brás Cubas, no romance de Machado de Assis, cuja obra está sendo reconhecida internacionalmente. Foi a mim que ele dedicou suas memórias. Sou o “operário de ruínas” dos versos de “Psicologia de um vencido”, do poeta Augusto dos Anjos. É dos escombros da vida, da minha e a dos outros, é da carne podre do ser humano que retiro a minha literatura. Declaro guerra à vida como o verme e sempre acabo sendo vencido.

Essa guerra se dá na garagem que transformei em biblioteca e lugar de escrita. Toca, bunker, caverna, não sei ainda como denominá-lo. Às vezes digo apenas “o meu canto”. Um lugar agora iluminado apenas por uma lâmpada sobre os teclados, refletindo minha enorme sombra na parede enquanto escrevo mais essa crônica que, se aceita pelo editor do jornal, passa pelas mãos do revisor (que salva o escritor de enormes fiascos), do diagramador e chega a você, leitor, neste espaço de opinião. Posso ser pequeno, mas minha sombra será sempre maior e assombrará ainda por muito tempo àqueles que querem me pisar.

Copiando Brás Cubas, “se te não agradar” esta crônica, leitor, “pago-te com um piparote, e adeus”.

Cassionei Niches Petry – professor e escritor

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