Meu artigo na Gazeta do Sul de hoje
Um retrato real do professor
É difícil escrever sobre uma obra de
arte que te dá uma porrada, te deixa tonto por um tempo. Assistir a um filme
como O substituto, de
2011, dirigido por Tony Kaye, me fez dar murros na mesa do computador (confesso
o sacrilégio de tê-lo visto no Youtube), pensar “o que este filme está fazendo
comigo?”, depois segurar o choro e dizer, movendo os lábios devagar,
“p#%@-que-pa-*”.
Um professor substituto, Henry
Barthes, interpretado magistralmente por Adrien Brody (de O
pianista), chega a uma escola onde vai lecionar por pouco tempo. Na
primeira aula, enfrenta dois alunos rebeldes, expulsa um deles (por ter
ofendido uma menina obesa, Meredith), mas mantém na sala outro aluno que
jogou a pasta do professor de encontro à porta e disse palavrões. O desconfiado
aqui pensou, “pronto, mais um daqueles filmes em que o professor consegue
reverter a situação de uma sala de aula problemática e todos vão viver felizes
para sempre e a mensagem é que os alunos são todos bonzinhos e é o professor
que tem que mudar seu comportamento, etc.” Não é o que acontece, apesar de o
professor conseguir o respeito e a admiração dos alunos, porém isso fica em
segundo plano, quase não aparece na história. E logo na resposta que o Henry dá
a Meredith após o episódio, sobre o motivo de ele ter agido de tal forma, levei
a primeira bordoada. Quase sou nocauteado no primeiro round.
Entretanto, me recuperei e fui adiante.
Há o desencanto dos demais professores
pela sua profissão, mas que seguem, ou porque gostam, ou porque não sabem fazer
outra coisa, ou por que se entopem com remédios, ou porque sim. Uns se sentem
invisíveis, outros apenas vivem, se conformam, estão acostumados, como diz
Barthes à aluna. Aguentam as mães que chamam as professoras de vadias, cuspidas
na cara, ofensas e tudo mais. É o sistema que desmorona, como a casa de Usher
do conto de Edgar Alan Poe, e não fazemos nada.
Outras pancadas? Barthes encontra uma
prostituta menor de idade que o aborda na rua para um “programinha barato”. Ele
nada faz com ela, mas a leva para casa, trata de seus ferimentos provocados
pela violência dos outros homens, cuida dela fazendo o papel de pai que ela não
tinha e ele também não. Henry também a todo instante se lembra de sua mãe, que
se suicidou depois de ser violentada pelo próprio pai, o avô que ele agora
visita numa clínica geriátrica. O professor cuida dos outros, dos alunos, da
menor prostituta, de seu avô abusador, da aluna obesa cujo pai não a incentiva
e a põe cada vez mais no chão. Barthes, no entanto, não consegue cuidar dele
mesmo. Vive só, triste, amargurado e por isso decide ser apenas um professor
substituto. Ele substitui o papel que deveria ser de outros, porém não sabe
qual o seu papel.
Um retrato duro, mas real, do
professor.
Cassionei Niches Petry
– professor
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