Não me felicitem, por favor!




                                                 Minha crônica no jornal Gazeta do Sul de hoje.

                                                Não me felicitem, por favor!

Como escreveu o grande cronista Leon Eliachar, o “aniversário é a comemoração que sempre fazemos com menos um ano de entusiasmo”. Por esses dias, eu faria aniversário. Digo “faria”, pois realmente não faço mais aniversário, apenas fico mais velho a cada ano. E é só. Parei de comemorar aos 40. “A vida era muito mais intensa quando não passava, na média, de quarenta anos. Agora é um longo, um interminável arrastar de correntes: nós somos as almas penadas deste mundo”, disse em um de seus aforismos o poeta Mário Quintana, que passou dos 80.

Quando jovem, ansiosamente queria chegar aos 18. Mas como demorava! Nem bem cheguei à maioridade, pisquei e, puf!, já “trintava”. Mais um pestanejada e veio o “quarentou”. Agora os olhos estão bem abertos, arregalados, grampeados como os do Alex, protagonista do filme do Stanley Kubrick, “Laranja mecânica”. Nessun dorma! Porém não adianta, Cronos, deus do tempo, é implacável, nos presenteando com rugas, cabelos brancos, miopia, dores no corpo e... o que mais... acho que estou esquecendo alguma coisa.

O lado bom de fazer aniversário é que, de certa forma, tu te transformas no centro das atenções no dia. Os colegas de trabalho no grupo de WhatsApp te felicitam e se lembram da tua existência, mesmo que tu não tenhas felicitado ninguém no resto do ano. Nas redes sociais há uma enxurrada de parabéns de gente que nunca conversou contigo (se tu deixares disponível o lembrete, porque, caso contrário, ninguém vai lembrar). Algumas empresas te oferecem desconto em serviços como balanceamento e geometria no teu carro, para depois te empurrarem um serviço mais caro. Ah, e tu até ganhas algum presentinho de alunos que te incomodam em 99% das aulas. O lado ruim é justamente ser o centro das atenções e te tirarem a tranquilidade de ficar quieto, no teu canto, lendo, pensando...

Como andei ficando mais pessimista com o passar do tempo, deixei de ver o aniversário como mais um ano de vida, mas sim como menos um ano de vida. Cantar “Parabéns pra você” não faz mais sentido. Na verdade, morro a cada dia.  A “indesejada das gentes”, a “iniludível”, segundo um poema do Manuel Bandeira, vai se aproximando para bater na minha porta. Celebrar que “ainda” estou vivo me faz lembrar “do inconveniente de ter nascido”, título de um livro do filósofo pessimista Emil Cioran. Será que mereço parabéns por ter um dia ter nascido e entrado neste mundo miserável?

Não por acaso são sopradas as velinhas do bolo. É a chama que se apaga, é a vida que se esvai. Não dizem que a vida é um sopro? Depois, só resta acender as velas no cemitério.

Cassionei Niches Petry – professor e escritor, autor de Desvarios entre quatro paredes, Editora Bestiário.


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