No Traçando livros de hoje, A loja dos suicidas
Como estou de férias, curtindo uma praia, minha coluna da Gazeta do Sul de hoje traz um texto já publicado aqui no blog. Também não tenho a imagem da página para postar. Segue o texto:
Morra ou tenha seu dinheiro de volta
La tienda de los suicidas, do francês Jean Teulé, (li a tradução espanhola, mas há uma edição brasileira pela Ediouro, A loja dos suicidas)
é um romance que desperdiça um tema abordado, num primeiro momento, de
forma interessantíssima, mas que acaba caindo num tom otimista, beirando
a autoajuda. O humor negro transforma-se numa ode à alegria, e a triste
cena final serve apenas para deixar uma mensagem de que “todos temos
uma missão a cumprir”.
A
história se passa numa época futura, depois de várias guerras e
mudanças climáticas, além do fim da camada de ozônio. O universo é
governado por uma ditadora, Indira Tu-Ka-Ta, informação que somente na segunda metade do romance aparece.
A família Tuvache é dona de uma loja especializada em produtos e
utensílios que ajudam as pessoas a se suicidarem: venenos, cordas para
se enforcar, blocos de concreto para amarrar ao corpo e se atirar em um
rio, facas, sacos plásticos para sufocamento, etc. O estabelecimento é
uma tradição familiar, sendo que seus membros levam a vida pensando
apenas em coisas ruins e depressivas – a mãe, por exemplo, contava
histórias de suicídios para as crianças dormirem e depois lhes desejava
bons pesadelos–, só não terminando eles mesmos com suas existências
porque não haveria ninguém para levar o negócio adiante.
O
slogan da loja não poderia ser diferente: “Sua vida tem sido um
fracasso? Conosco sua morte será um êxito!” Quando um cliente sai da
loja dizem sempre “adeus” e nunca “volte sempre”. O sucesso é nunca
trazer o cliente de volta.
Os
nomes dos membros da família foram dados em homenagem a suicidas
famosos. O pai, Mishima, foi nomeado com o sobrenome do escritor japonês
que cometeu harakiri; Vincent, o irmão mais velho, refere-se ao pintor
Van Gogh; a irmã, é Marilyn, homenagem à Monroe; já o caçula é o Alan,
cujo xará, Alan Turing, considerado o “pai da informática”, teria se
suicidado comendo uma maçã que foi imersa em cianeto.
Pois
é o irmão mais novo o culpado pela quebra de equilíbrio na história,
necessária, nessa caso, para gerar os conflitos. Ao contrário dos
demais, o menino, sorri, é feliz, canta, brinca e incita os clientes a
desistirem de morrer. É a ovelha negra da família, a que anda no caminho
errado, mas que acaba levando, previsivelmente, toda a família para seu
lado. É aí que o enredo decepciona e perde toda a ironia inicial.
O
livro foi adaptado para o teatro e o cinema, num longa de animação.
Ambos, assim como o romance, devem agradar aos jovens, que procuram
histórias mais divertidas, objetivo que tinha o autor, segundo revelou
em uma entrevista. No entanto, devem frustrar os adultos ranzinzas e
pessimistas como eu, que esperam da arte mais do que simples
entretenimento.
Cassionei Niches Petry é professor, mestre em Letras e escritor. Publicou Arranhões e outras feridas (Editora Multifoco) e mantém um blog, cassionei.blogspot.com. O suicídio na literatura é um de seus temas de estudo.
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