O dia em que a Terra parou


Conto do meu livro Arranhões e outras feridas. (Porque hoje é 11 de setembro.) 

“a noite tem peso/e tem feridas”, Noite em chamas, Romar Beling

São mais ou menos oito da matina e estou fechando o primeiro baseado do dia, ouvindo o Raul: “O dia em que a Terra parou”. A mulher do meu lado ainda dorme. Tento acordá-la: “Tu não trabalha, não?”. Ouço apenas um grunhido que tanto pode significar um “sim” ou um “não enche, porra, que eu quero dormir”.

Não sei nem seu nome. Eu a encontrei ontem à noite na Imigrante com uma long neck, na mão, recitando Bilac (ou cantando a música da Paula Toller, não sei): “...direis ouvir estrelas, certo perdeste o senso”. Perguntou se eu não tinha um baseado, eu disse que só em casa. Viemos pra cá, mas quando chegamos, ela desabou na cama dizendo “boa noite, amor” e apagou.

Olho pro calendário, dia 11, meu aniversário. Tenho alguma coisa pra comemorar? Será que vai aparecer alguém da família hoje à noite ou ninguém vai vir porque eles sabem que eu não vou pagar a festa sozinho? Querem só boca livre. Os amigos a mesma coisa. Melhor dizendo, meus conhecidos, já que amigo mesmo é como baseado bom, só consegue quem tem dinheiro. Aliás, essa erva ainda não fez efeito. Será que o Índio me vendeu bosta de vaca?

Sento na frente da cama e observo a mulher. Não acredito que dormi ao lado dela e não fiz nada. Olha só que corpo. Ao menos não sou um desses que pegam mulher e estrup...estu-pa...Puta merda! Acho que tão começando as pauladas ficar olhando pra esse rabo levantado tá me deixando louco ou é o efeito da erva ou são os dois juntos ou tô sentindo sono ah sei lá oh a TV não lembro se tinha ligado ela ihhh! oh as torres do congresso bah! dois aviões bateram nelas ah ah ah e aquela corja de ladrões senadores deputados bah tá desabando tudo que fumaceira que fumaceira aqui também tem fumaceira fogo na bomba bah o que vai ser do futuro das crianças o programa da Angélica tá muito louco. 

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