Minha crítica sobre "Os irmãos Tanner", de Robert Walser
Minha crítica sobre "Os irmãos Tanner", de Robert Walser (Companhia das Letras), no blog do Gustavo Nogy no site do jornal Gazeta do Povo de Curitiba:
http://www.gazetadopovo.com.br/blogs/gustavo-nogy/2018/04/07/o-admiravel-escritor-das-neves/
O admirável escritor das neves
por
Cassionei Niches Petry
Apesar
de Robert Walser (1878-1956) ser um
dos escritores preferidos de dois dos meus ídolos literários (Enrique
Vila-Matas e Franz Kafka), eu vinha adiando a leitura de suas obras. Comecei a
lê-lo somente agora, com o lançamento de Os irmãos Tanner (Companhia das
Letras, tradução de Sergio Tellaroli, 286 páginas).
De
certa forma, acabei seguindo, involuntariamente, os passos do protagonista,
Simon Tanner, um jovem indeciso, que vai adiando a estabilidade em algum emprego,
mantendo um relacionamento pouco duradouro com a família e apenas caminha,
caminha, indo de um lugar a outro sem muita paragem, esticando a vida. Assim eu
ia, pulando de um livro a outro, e deixando meu exemplar de O ajudante, outro romance do escritor,
intocável na prateleira (e ainda está).
Para
Vila-Matas, em um perfil de Walser no livro Para
acabar con los números redondos, a prosa do escritor suíço é assim, “no va
a ninguna parte, sólo se estira y estira como quien sale de una siesta y quiere
darle alegría al cuerpo”. Qualquer semelhança com O castelo, de Kafka, não deve ser coincidência.
Os
irmãos do título são cinco (inspirados na própria família do escritor): Simon,
o protagonista, Klaus, Kaspar, Emil e Hedwig, a única mulher. Eles vão
aparecendo (menos Emil, internado num hospício, e que é apenas mencionado por
outros personagens) conforme as deambulações de Simon vão se sucedendo.
Kaspar,
um pintor, divide um apartamento com Simon durante um tempo, até este, claro,
resolver mudar de vida e conseguir um emprego: “Há um certo sentido em viver
como a maioria. Essa minha ociosidade e singularidade estão começando a me
irritar”.
Simon
acaba indo, durante um inverno rigoroso, à casa de Hedwig, que trabalha como
professora num povoado bem afastado, onde há muita neve. Ela o ampara,
deixando-o morar ali. Quando percebe que ele vai embora, não faz nada para
impedi-lo e o aconselha: “Tente se tornar um bom homem. Meta-se em assuntos
públicos, faça que falem de você (...). Ou siga vivendo como você pode e sabe,
permaneça na escuridão, lute na escuridão com os muitos dias ainda por vir”.
Klaus,
mais velho e responsável, tem uma vida mais estável como pesquisador universitário,
e é quem chama a atenção do irmão quando faz uma vista a Hedwig e o encontra
por lá. Sobre o que as outras pessoas pensam de seu comportamento errático, ele
diz: “De você, elas sempre pensam: ele devia levar uma surra; uma bela surra é
o que ele merece! Espantam-se e não compreendem como é que você ainda não
mergulhou num abismo. A ninguém ocorreria compadecer-se. De modo geral, consideram-no
um rapaz despreocupado, abusado, e feliz. É isso mesmo?”.
Não
temos uma reviravolta na vida do protagonista. Nada de clímax e desfecho que
surpreenda. O romance termina, de certa forma, como começa. Paradoxalmente,
Simon, um personagem volúvel, é plano, previsível. Chega a nos irritar com seu
comportamento. Permanece na escuridão. Talvez isso tenha feito com que não me
entusiasmasse muito com a leitura de Os
irmãos Tanner. Sofro um pouco com isso de ler os muitos elogios de
terceiros a um autor e criar uma expectativa exagerada. É um romance, porém,
que trata do indivíduo, de como ele pode lidar com uma sociedade que não o
entende, ou de como pode fugir dela. É uma faceta do ser humano, e é sobre o ser
humano e seus defeitos de que trata a boa Literatura.
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