Vamos falar sobre suicídio - Setembro amarelo


Crônica que publiquei no dia 17 de setembro de 2018 no jornal Gazeta do Sul.

Vamos falar sobre suicídio

Enquanto reflito sobre o suicídio, não o cometo. Quando a mente se ocupa com algo, não há chance para se pensar em outra coisa. Discutir sobre o assunto são maneiras de evitar dar outro passo em direção ao abismo. É um erro esconder o problema achando que ao mostrá-lo se está incentivando a pessoa a tirar a própria vida. O chamado “Setembro amarelo” é uma campanha que serve para pensarmos sobre isso.
A maioria das pessoas, de certa forma, já pensou na possibilidade de se matar, umas até por brincadeira, outras levando muito a sério. Como escreveu Albert Camus, em O mito de Sísifo, “todos os homens sadios já pensaram no seu próprio suicídio alguma vez”. O tema é um tabu em toda a sociedade. Como é um fator presente na vida do ser humano, tentar compreendê-lo se faz necessário.
O senso comum diz que o suicídio é uma atitude de quem está desesperado, por motivos amorosos ou financeiros. Há, no entanto, também fatores ontológicos. Albert Camus afirma: “Só existe um problema filosófico realmente sério: o suicídio. Julgar se a vida vale a pena ser vivida é responder à pergunta fundamental da filosofia”.
A. Alvarez, amigo da poeta Sylvia Plath (que se matou enfiando a cabeça no forno do fogão a gás ligado), tentou a morte voluntária depois de passar por terrível depressão e escreveu depois um importante estudo, O deus selvagem (Ed. Companhia das Letras). Ele afirma no prefácio: “Nenhuma teoria será capaz de desvendar um ato tão ambíguo e de razões tão complexas quanto o suicídio” e que “sempre será parcial qualquer explicação que forjemos”. Isso vem de um sujeito que passou por esse problema, depois procurou tentar entendê-lo e escreveu para nos fazer tentar entender.
“Se não é possível a um terceiro compreender, é-lhe ainda menos possível julgar”, escreveu Georges Minois em História do suicídio (Editorial Teorema). Os tribunais das redes sociais ampliam as condenações de quem se mata (e quem sofre com as ofensas é, obviamente, a família) e de quem aborda o assunto, pois estaria incitando a cometê-lo. As redes sociais censuram o tema através dos algoritmos. Outros querem censurar a série 13 reasons why por ser um suposto “gatilho” para os jovens se suicidarem. Ora, por que não pode ser um “gatilho” para o debate? Não precisamos discutir as questões abordadas na história?
Fugir da discussão do tema não é solução. Faz parte da vida essa possibilidade, faz parte do absurdo da nossa existência querer deixar de existir. Citando mais uma vez Albert Camus: “Com o puro jogo da consciência, transformo em regra de vida o que era convite à morte – e rejeito o suicídio”.
(Cassionei Niches Petry é autor do e-book “Vamos falar sobre suicídio? - crônicas e ensaios sobre a morte voluntária na literatura”, edição Kindle/Amazon.

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