Bom livro e uma estreia matadora
(Foto: divulgação)
Leonardo Brasiliense é um artista inquieto. Além da
literatura, tem um projeto de roteirista que vem dando bons resultados e também
pratica a fotografia, sempre com um olhar peculiar para os objetos, paisagens e
pessoas retratadas. Longe das redes sociais (posição que invejo nele), a
dedicação às letras resulta em obras premiadas, do conto ao romance, passando
também pela literatura voltada para o público mais jovem. Já resenhei por aqui
seu romance Roupas sujas (Companhia
das Letras), narrativa sobre a qual
fiz algumas ressalvas, mas que alcançou aplauso quase unânime da crítica.
Essa vontade de experimentar, que é característica de
Leonardo, fez com que ele publicasse seu recente livro por uma editora
estreante, a Coralina, que tem como uma de suas cabeças outro artista que não
se acomoda, o Cláudio B. Carlos, que gentilmente me enviou em primeira mão uma
versão em PDF da obra às vésperas do lançamento, o primeiro da editora, e que
furou minha fila de leitura.
Eu vou matar Maximilliam
Sheldon tem 128 páginas e 10 contos que comprovam a mão firme de Leonardo
Brasiliense no gênero e mostra o trabalho competente da estreante editora, num
trabalho gráfico lindo de se ver e que simboliza o tom sombrio e estranho das
histórias. A primeira delas, “Cafezinho
e castigo”, título claramente inspirado em Dostoiévski, é uma boa porta de
entrada, pois o enredo inquieta o leitor e mais sugere do que revela, recurso
importante que é o tom das demais narrativas. O personagem, com o curioso
apelido de Cavaquinho, sai da casa de sua mãe, numa cidadezinha do interior,
aparentemente depois de matá-la. Vai visitar um velho amigo que estaria
trabalhando na agência de Correios local, mas não o encontra. A partir daí,
muitos fatos estranhos acontecem e não sabemos se são fruto do sobrenatural ou
do acaso.
Outros contos também ficam no limiar do fantasioso e da
realidade. Pode-se acreditar na quiromante do conto “Sábado à noite”, conto em
que aparecem cenas do cotidiano dos moradores de um bairro pobre? Será mesmo que
o marido do conto “Morrer aos poucos” desapareceu estranhamente dentro da
própria casa? E o vendedor de maçãs maltrapilho realmente vê o futuro em “Na
frente da casa tinha um vidente”?
Há contos tragicômicos, como “Querubins”, e experimentais,
como “Uma vida ou mais”, composto por um diário, mas cujas entradas não aparecem
na ordem cronológica. A porta de saída é o conto que dá título à obra e é
inspirada numa música lado B do segundo disco do Ultraje a Rigor, banda de rock
dos anos 80, em cujo enredo, o protagonista, ao contratar os serviços de um
detetive, começa a achar estranho que ele se torna o alvo das investigações,
tudo no mesmo tom debochado das letras do Roger, líder do Ultraje.
Mais um bom livro do Brasiliense (que é gaúcho) e uma boa
estreia da editora (também gaúcha), que homenageia no nome uma grande poeta
(que era goiana). Vida longa à Coralina!
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