Pensando alto sobre a crítica atual

 


por Cassionei Niches Petry


O francês André Bazin (1918-1958) disse: “A função do crítico não é trazer numa bandeja de prata uma verdade que não existe, mas prolongar o máximo possível, na inteligência e na sensibilidade dos que o leem, o impacto da obra de arte”. Ele se referia à atividde de crítico de cinema, no entanto, podemos estender isso à literatura. Depois de uma leitura, e não antes, busco, como leitor, resenhas ou críticas sobre as obras, para que ainda possa continuar a digeri-las. Na verdade, procuro outras leituras para que eu possa ler o que não li, para encontrar impressões diferentes ou para comprovar as minhas impressões. Errei ao interpretar tal trecho? O escritor escreveu aquilo mesmo?


Hoje, no Brasil, há cada vez menos críticos e também menos espaços para os que ainda se arriscam no gênero. Ah, mas e a internet?, você, leitor (ainda está ai?), pergunta. Acontece que as boas críticas se perdem na rede, os críticos, por isso,  desistem de escrever e o espaço é ocupado por comentadores de livros, por reprodutores de releases das editoras, por videozinhos bem editadinhos com resuminhos dos livrinhos.


Os principais jornais do Brasil estão deixando de lado a crítica. O Estadão, por exemplo, chegou a, na surdina, extinguir o tradicional “Caderno 2”, transformando-o no “C2, Cultura & Comportamento”, dando ênfase ao segundo C. As matérias jornalísticas intercaladas por entrevistas com escritores ainda resistem, principalmente na “Ilustrada”, da Folha de São Paulo. Algumas publicações exclusivamente literárias sobrevivem, porém as abordagens dos temas obedecem às pautas identitárias, de minorias, e evitam tratar de obras que causem “cancelamentos”.


Os “booktubers” e “criadores de conteúdo” para redes sociais são mais valorizados. Autores e editoras repercutem mais esses profissionais, que acabam fazendo publicidade e não a crítica propriamente dita. Há casos em que editoras remuneram o profissional, além de dar livros de cortesia para quem vai escrever ou falar sobre as obras (eu mesmo recebia exemplares de algumas editoras quando escrevia para jornal e ainda recebo de alguns escritores, mas nunca recebi um real de ninguém, nem mesmo dos veículos para os quais escrevia). Ser presenteado com um livro é prática antiga e necessária, pois o crítico não tem como comprar muitos livros, porém ser pago diretamente pelos interessados obriga o crítico ao elogio ou a fingir ignorar os defeitos da obra. Aí é um desserviço à literatura.


Voltando ao início, o crítico até pode pegar leve na análise, no entanto não pode abdicar de mostrar ao leitor caminhos para uma apreciação proveitosa. A resenha que provoca intelectualmente e não diz obviedades torna-se também uma criação ou recriação literária.



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