Como pedra que rola. Gazeta do Sul, página de Opinião, 21 de maio de 2008. O texto causou bastante polêmica. Recebi vários e-mails com muitas críticas. Além disso, foi publicada uma carta na Gazeta atacando o artigo.
COMO PEDRA QUE ROLA

(Observação importante: crônica repleta de lugares-comuns. Se não gosta de texto com muitos chavões e auto-ajuda, não leia. Eu não leria.)

Escrevo ainda sob o impacto da peça teatral Bailei na curva. Os que já tiveram o privilégio de assisti-la nos seus 25 anos de existência sabem do que estou falando. Riso, choro, indignação e reflexão se mesclam nessa importante obra escrita por Júlio Conte. Um trecho, no entanto, se fixou na minha memória de tal forma que não posso deixar de comentar: quando a jornalista lê um poema que escreveu sobre o personagem Pedro, morto nos porões da ditadura. Diz que Pedro foi uma pedra no sapato dos poderosos da época, pois foi um jovem que ousou pensar diferente.

Pergunto-me se existem hoje Pedros entre os nossos jovens. Creio que não. Existem apenas aqueles que atiram pedras nos outros em uma violência gratuita. Fazem badernas, arruaças, mas não têm argumentos para defender suas idéias (se é que as têm, pois geralmente reproduzem frases prontas). Ou aqueles que se utilizam de pedras que enfeitam canteiros para depredar o patrimônio alheio, como aconteceu há alguns dias na nossa cidade.

Se Drummond diz que “tem uma pedra no meio do caminho”, o que podemos fazer para removê-la? Temos três alternativas: ou a levamos para cima de uma montanha, mesmo sabendo que ela vai rolar de novo para baixo, tal qual Sísifo cumprindo um castigo dos deuses; podemos ainda contorná-la e seguir adiante, mas ela continuará lá; ou, então, a destruímos para sempre, sem esquecer, porém que outras pedras aparecerão pela frente.

Se seguirmos a primeira opção, estaremos aceitando nossa vida cotidiana, o eterno retorno do mesmo, nos contentando em acordar, trabalhar, dormir, acordar, trabalhar, dormir. Aceitando que o reino dos céus é dos pobres, acreditando em tudo que o comentarista careca da televisão diz. Sendo como o Pedro Pedreiro da canção do Chico Buarque: “Esperando, esperando, esperando/ Esperando o sol/ Esperando o trem/ Esperando o aumento/ Desde o ano passado/ Para o mês que vem.” Atire a primeira pedra quem não é ou já foi assim.

Se seguirmos a segunda opção, estaremos buscando em outras pedras a fuga dos problemas: a pedra do jogo do bingo, a pedra do crack. Na selva de pedra em que vivemos, não podemos apenas contornar os problemas, pois eles vão se acumulando. Ao contrário da personagem bíblica que se transformou em uma estátua de sal, temos sim que olhar para trás e resolvermos as coisas que ficaram pendentes.

Acredito que devemos seguir a terceira opção. Devemos ser mais duros do que as pedras que atravessam nosso caminho. Só o que não pode ser duro como pedra é o nosso coração.

Cassionei Niches Petry – escritor e professor de Língua Portuguesa e Literatura

Comentários

Anónimo disse…
ALEEEEEEEEEP, PSOR! Baita texto, ainda lembrada dele!
Sucesso. Abraço!

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