O veneno da religião segundo Hitchens




No Traçando livros de hoje, no jornal Gazeta do Sul: http://www.gaz.com.br/gazetadosul/noticia/321035-o_veneno_da_religiao_segundo_hitchens/edicao:2011-12-28.html

Cassionei Niches Petry

Escritor e jornalista, Christopher Hitchens – morto recentemente devido a um câncer no esôfago, aos 62 anos – era um dos “Quatro Cavaleiros do Ateísmo”, juntamente com Richard Dawkins, Daniel Dennett e Sam Harris. A denominação é uma brincadeira com a profecia bíblica do Apocalipse, já que esses pensadores lideram um movimento – chamado neo-ateísmo – de combate à religião e a tudo de nefasto que ela traz. Hitchens expôs essa ideia em Deus não é grande – como a religião envenena tudo (Ediouro, tradução de Alexandre Martins, 304 páginas).

O autor inicia o livro falando sobre sua professora na escola primária, a sra. Watts, que ensinava sobre a natureza e as Escrituras. Em uma das aulas, ela afirmou que Deus, poderoso e generoso, teria criado as árvores e a grama verdes, por ser a cor mais repousante para os olhos. O pequeno Hitchens, de apenas 9 anos, percebeu o falso conceito da professora, pois, pela lógica, os olhos estão ajustados à natureza, não o contrário. O episódio destruiu não só a admiração que o aluno nutria pela professora, como também sua fé.

A partir desse momento, começou a notar “outras esquisitices”: “Se Deus era o criador de todas as coisas, por que deveríamos ‘louvá-lo’ de forma incessante por fazer o que para ele teria sido tão natural? (...) Se Jesus podia curar um cego que tinha conhecido, por que não podia curar a cegueira? (...) Apesar de todas aquelas orações constantes, por que não havia resultado?”. Nascia aí, bem jovem, o antiteísta polêmico.

Os capítulos subsequentes (com títulos como “A religião mata” e “A religião é abuso infantil?”) trazem informações críticas sobre como as religiões, principalmente as monoteístas, tentam de todas as formas serem as donas de uma verdade absoluta, impondo aos demais sua crença. Os argumentos utilizados por Hitchens se valem, além das histórias pessoais, de análise de textos religiosos e relatos documentados. O 11 de setembro, por exemplo, é uma presença constante no livro, uma vez que o extremismo religioso islâmico foi o motor das ações terroristas, justificadas por passagens do Corão. O islamismo também é criticado pela sentença de morte contra o escritor Salman Rushdie, depois das publicação de Versos Satânicos, o que obrigou seu autor a viver durante anos sob forte aparato de segurança.

O livro também reserva espaço à Madre Teresa de Calcutá. Hitchens conheceu de perto o trabalho da religiosa ao realizar uma reportagem e escreveu um livro (The Missionary Position) sobre o falso interesse dela pelos pobres, o que o levou a ser convidado pelo Vaticano para ser o “Advogado do Diabo” no processo de beatificação da freira, pois também havia desmascarado um falso milagre atribuído a ela. Em Deus não é grande, Christopher (nome irônico para um ateu, não acham?) a chama de “freira ambiciosa”.

É importante que se diga: o livro de Hitchens não se propõe a converter ninguém, como apregoam seus detratores. Deus não é grande deve ser lido, afirmo eu, por quem já é descrente e procura se aprofundar no assunto, já que a obra é repleta de informações de quem, como jornalista, conhecia bem a realidade mundial e não tinha medo de expor suas críticas às religiões, que “ensinam as pessoas a pensar em si de forma abjeta, como pecadoras infelizes e culpadas, prostradas frente a um deus raivoso e ciumento”. Como afirmou Richard Dawkins, ao se despedir do amigo, Hitchens “foi um homem que lutou contra todos os tipos de tiranos, incluindo Deus”.

Cassionei Niches Petry é mestrando em Letras pela Unisc, com bolsa do CNPq. Para desgosto da família, é ateu. Escreve suas impressões de leituras no Mix quinzenalmente e mantém o blog cassionei.blogspot.com.

Comentários

Yaskara disse…
Adorei a reflexão e fiquei com vontade de ler. Só discordo em um ponto: acredito que o livro deve ser lido por quem tem algum tipo de fé, sim. Isso não quer dizer que aqueles que acreditam (não digo em Deus, mas que têm algum tipo de fé) não possam refletir sobre... O negócio é ter a cabeça aberta... Parabéns, colega. Yaskara
Cassionei Petry disse…
Obrigado pelo comentário, Yaskara. Abraço.
Anónimo disse…
não acho este livro para comprar em lugar algum!
Cassionei Petry disse…
Pesquisa no google, fiz agora e está disponível nas livrarias.

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