Sábado à tarde, chuva sobre a terra até há pouco seca
Sábado à tarde, chuva sobre a terra até há pouco seca. O
cheiro de terra molhada me transporta para outro sábado, um sábado de meados
dos anos 80. Estou sentado à mesa da cozinha, assistindo à televisão. Não temos
sala de estar na pequena casa de madeira onde moramos. A TV Philips em preto e
branco fica sobre um balcão próximo à geladeira. O programa é o “Cassino do
Chacrinha”. Benito di Paula, com seu modo peculiar de fazer samba, e sua
aparência mais peculiar ainda, dedilha no piano um dos seus sucessos. Minha mãe
termina de assar pão. O cheiro de pão saindo do forno se mistura com o da terra
molhada. Meus amigos me chamam para jogar bola no campinho, minha mãe me deixa
ir. Sou goleiro. Defendo como poucos, mas aceito essa posição porque sou muito ruim
jogando na linha. Quando volto para casa, esfrego as plantas dos pés encardidos
na laje molhada. Vou para o banho. Enquanto fecho os olhos para passar xampu
nos cabelos, me imagino sendo um cantor de sucesso ou um goleiro da seleção
brasileira no futuro. Quando abro os olhos, estou sentado em frente ao
computador, sentindo ainda o cheiro que vem da rua, e me deparo com a tela em
branco, o cursor piscando, impaciente.
Comentários
"Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo".
Gosto dessas reminescências. As fragrâncias são portais dimensionais.
Abraços!