O escritor observando os outros dançando
Dizem que hoje é (foi)
o Dia do Escritor. Não era dia 25 de julho? Ah, sim, no dia 25 era o dia
nacional, hoje é o mundial. E 23 de abril? Me deixa procurar no Google... Aqui
está, é o Dia Internacional do Livro. Datas, datas. Não me acostumo com elas,
pois são formadas por números. Sou mais das palavras, apesar de os números
também poderem ser expressos por letras.
Posso dizer que sou
escritor? Posso comemorar esse dia? Podem me parabenizar por isso? Alguns chatos
de plantão dizem que não, pois para eles ninguém pode se dizer escritor e sim a
crítica decide ou então quando o escriba já tem uma obra consolidada,
reconhecida pelo meio editorial e pelos leitores, aí sim o sujeito pode se
intitular assim. Acatando o que esses caras dizem, às vezes me chamo apenas de
escriba ou um metido a escritor. Sinto vergonha de me colocar como tal. Mas,
poxa, se o Paulo Coelho e que tais podem ser escritores, por que eu não posso?
Ah, claro, deve ser porque não vendo milhares de livros (meu livro de contos, Arranhões e outras feridas, não ultrapassou
os três dígitos na venda, mas quase chegou lá).
Cometi um atentado à
literatura, então, ao publicar um segundo livro (primeiro romance ou narrativa
longa, na verdade não muito longa). Os
óculos de Paula foi escrito durante dois anos (ou mais, se contar que
alguns fragmentos já existiam bem antes em anotações e até no blog) junto com
notas sobre o processo de criação da obra. Os dois juntos, romance + notas,
resultaram na minha dissertação de mestrado em Letras. Foi um livro pensado e
repensado e ainda contou com a leitura e sugestões de um grande leitor, o
professor Norberto Perkoski, especialista na obra de João Gilberto Noll e na
literatura erótica (aliás, aproveito para dizer que, ao contrário do que pode
querer mostrar o trecho do romance destacado na quarta-capa do livro, minha
literatura não tem nada de erótica, foi escolha da editora), sem contar que foi
avaliado por uma banca de peso, que elogiou o trabalho (o escritor Sérgio
Schaefer e a professora da UFRGS Márcia Ivana de Lima e Silva).
Publicar o segundo livro
foi um parto tão difícil quanto o primeiro e a vida dele parece que vai seguir
o mesmo caminho, o do esquecimento, talvez, mas já não me importo. Escrevo e
continuarei porque gosto de Literatura, porém não sei se publicarei um
terceiro, pelo menos não nos moldes dos dois. Como não sei fazer o jogo
literário do “me elogia que eu te elogio”, do “me enaltece que eu te divulgo”,
do “me puxa o saco que eu te ajudo a ser publicado” e não sei me promover, minha
carreira literária está fadada a ser discreta e que bom que assim seja (não por
acaso não fiz questão de que saísse minha foto na orelha do livro).
Já falei muito em fracasso, inclusive na
dissertação de mestrado. Não falo mais. Inclusive fiquei sabendo que perdi mais
um concurso literário, dos poucos que participo. Em outros tempos estaria
chutando o balde e chorando nas redes sociais. Hoje, mais maduro ou menos
ingênuo, sei que tudo é um processo que não temos como controlar. O melhor é
seguir o baile e ver os outros dançando enquanto fico sentado, com meu copo de
refrigerante, observando e batendo o pezinho.
Comentários
Conselho do dia.
(Nunca escrevi isso aqui, mas lá vai: gosto muito de seu jeito ponderado de escrever; um jeito analítico, calmo, muito pensado, antiquado e meio anacrônico com o andamento do mundo. Talvez fosse o caso de você escrever aqui um texto sério sobre suas influências literárias, por que me vem à cabeça algo sobre elas.)