"A Copa ou a vida", minha crônica na Gazeta do Sul de hoje


A COPA OU A VIDA

Popularmente, se diz que religião, política e futebol não se discute. Concordo em partes, porque um debate sempre nos ajuda a construir o conhecimento. Isso, claro, se prevalecer a razão e, por conseguinte, os debatedores reconhecerem quando estão errados.

Porém, muitos não querem ver ruírem suas convicções e perderem algo que lhes dá apoio. O religioso busca na fé um sentido para sua vida. O militante vê apenas no seu partido as soluções para os problemas de um país. O torcedor jamais vai admitir que seu time é inferior ao outro. Deixam-se levar mais pelo lado emocional e, quando questionados, se não têm mais argumentos para se defenderem, podem partir para a violência.

No Brasil, de uma forma geral, as pessoas dificilmente discutem suas crenças religiosas, pois basta a palavra do padre ou do pastor para sustentar sua fé. Já no campo político, os debates fervem e não se admite o contraditório.
Da mesma forma o futebol. Todos têm sua opinião e vão até as últimas consequências para defender seu time. Nem nessa época que se disputa uma Copa, se chega a um consenso, pois cada um tem sua escalação preferida e não nutre a mesma simpatia pelo treinador. Só na hora do apito inicial todos se unem “numa só emoção”, como diz um antigo slogan de uma rede de TV.

Esporte curioso, o ludopédio. Sim, ludopédio. Foi o nome que os gramáticos tentaram colocar no lugar do estrangeiro football. Mas num país que prefere shopping center a centro de compras (ou slogan em vez de frase de efeito), lógico que não ia pegar. Aportuguesou-se a expressão, na medida em que o jogo abrasileirou-se. Da mesma forma, deixou de ser da elite para se tornar popular e, principalmente, masculino. Aliás, há uma analogia psicanalítica que tenta entender o interesse do homem por esse esporte: o pé e a bola são símbolos do órgão sexual masculino, a goleira é o feminino e o gol é o orgasmo. É o momento de alegria de um lado e o sentimento de perda do outro.

Nesse sentido, o futebol é uma metáfora para a vida: às vezes ganhamos, outras perdemos; há solidariedade e há deslealdade; há bondade e há violência; às vezes há jogo limpo, outras vezes há desonestidade; há tristezas e há alegrias; há tolerância e também preconceito; existem times pobres, outros ricos e alguns muito ricos; há baixos salários e há altos salários; erramos, acertamos; brigamos, fazemos as pazes; batemos e apanhamos. Não podemos, porém, esquecer: os jogos terminam e se repetem em outros dias, os campeonatos se repetem todos os anos. A Copa da Vida, no entanto, não tem repetição.

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