"Outra Canção do Exílio", Eduardo Alves da Costa

 


Outra Canção do Exílio

Eduardo Alves da Costa

 

Minha terra tem Palmeiras,
Corinthians e outros times
de copas exuberantes
que ocultam muitos crimes.
As aves que aqui revoam
são corvos do nunca mais,
a povoar nossa noite
com duros olhos de açoite
que os anos esquecem jamais.
 
Em cismar sozinho, ao relento,
sob um céu poluído, sem estrelas,
nenhum prazer tenho eu cá;
porque me lembro do tempo
em que livre na campina
pulsava meu coração, voava,
como livre sabiá; ciscando
nas capoeiras, cantando
nos matagais, onde hoje a morte
tem mais flores, nossa vida
mais terrores, noturnos,
de mil suores fatais.

Minha terra tem primores,
requintes de boçalidade,
que fazem da mocidade
um delírio amordaçado:
acrobacia impossível
de saltimbanco esquizóide,
equilibrado no risível sonho
de grandeza que se esgarça e rompe,
roído pelo matreiro cupim da safadeza.

Minha terra tem encantos
de recantos naturais,
praias de areias monazíticas,
subsolos minerais
que se vão e não voltam mais.
 
A chorar sozinho, aflito,
penso, medito e reflito,
sem encontrar solução;
a não ser voar para dentro,
voltar as costas à miséria,
à doença e ao sofrimento,
que transcendem o quanto possam
o pensamento conceber
e a consciência suportar.

Minha terra tem palmeiras
a baloiçar, indiferentes
aos poetas dementes
que sonham de olhos abertos
a rilhar os dentes.
 
Não permita Deus que eu morra
pelo crime de estar atento;
e possa chegar à velhice
com os cabelos ao vento
de melhor momento.
Que eu desfrute os primores
do canto do sabiá,
onde gorjeia a liberdade
que não encontro por cá.

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