Uma dívida com Walmor Santos

 


O escritor desconhecido fica todo bobo quando um grande homem das Letras lhe dá atenção, incentivo e o vê como um amigo com quem pode conversar, trocar opiniões, sugestões de livros e filmes e até desabafar. Foi o que aconteceu comigo, o desconhecido. O gigante era Walmor Santos, em que pese ele ter sido nos últimos tempos escanteado até por quem lhe devia muito. WS morreu ontem, mas nos legou uma obra de primeiríssima qualidade, além de ter escrito seu nome na história da Literatura do Rio Grande do Sul com a editora que levava as inicias do seu nome e a revista literária Blau.

Como escritor, experimentou quase todos os gêneros. Foi no conto, porém, que nos deixou obras-primas, a partir dos anos 90, em livros como “O ventre da terra” e “O paraíso é no céu de sua boca”. No conto “Alquimia para transportar demônios ao céu”, que intitularia anos depois a sua antologia pessoal, uma prostituta socorre um padre que cai bêbado na rua, o leva a sua casa, cuida e protege o homem como um filho, uma Pietà em um primeiro momento, mas que logo dá lugar a uma Madalena que o faz “delirar num templo dourado, entre vitrais multicores e um coral de virgens”.  O crítico Miguel Sanches Neto escreveu sobre os personagens de Walmor Santos: “É no exercício da condição humana que eles encontram um caminho para o sublime, e não na renúncia a ela”.

Depois de publicar por algumas das principais editoras gaúchas, Walmor fundou sua própria, a WS Editor, que logo se tornou o trampolim de novos autores, como Altair Martins, mas também reeditou escritores consagrados, caso de Charles Kiefer, em edições que contavam com ensaios de pesos-pesados da crítica do RS, como Volnyr Santos. Através da editora, levou muitos escritores às escolas, no Projeto Autor na Sala de Aula. Não contente com isso, criou a Blau, a primeira publicação literária que o jovem Cassionei assinou, uma revista que também revelou novos talentos e serviu como um norte para quem buscava o que ler, já que os suplementos literários começavam a minguar. Infelizmente, foi mais uma revista literária que terminou. O Walmor chegou a me dizer em uma de nossas conversas no Messenger: “Por causa da revista, fali. Idealismo burro”.

Fiquei com uma dívida com ele. Ele queria ir ao colégio onde leciono para falar sobre Literatura, mas acabei não organizando nenhum evento (sou péssimo nisso). Também não escrevi nenhuma resenha sobre sua obra, embora tenha me enviado um de seus livros. Pelo menos, porém, pude dizer a ele de minha admiração e reconhecimento pelo que fez pela Literatura. De quebra, recebi um belo conselho, quando disse que eu era apenas um aspirante a escritor: “Sem essa de aspirante. Quem escreve por que precisa escrever já é escritor. Publicar, fazer sucesso, etc., são lantejoulas”. Obrigado, mestre!

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