Ainda sobre as fitas cassete


No ano passado, neste mesmo espaço, escrevi sobre as minhas fitas cassete (K7 para os íntimos), sobre jogá-las ou não no lixo, já que novas formas de ouvir música se impõem atualmente, principalmente o streamimg. Volto a falar sobre elas, pois mais uma vez resolvi fuçar as caixas de sapato que contém meu acervo (que ainda não foi descartado, portanto), em busca de tesouros ainda não reencontrados. Se há algo que me arrependo, a propósito, é de ter regravado tanta coisa por cima do que gravava do rádio. É uma história que se apagou. A justificativa, no entanto, é que não tinha dinheiro para comprar fitas virgens e tinha que reaproveitar as que não ouvia mais ou ouvia muito pouco. Preenchia com pedacinhos de papel ou colava pedaços de durex no buraquinho na parte superior, o que possibilitava o acionamento da tecla REC do aparelho de som e, então, reutilizava o material.

Muita coisa se perdeu conforme meu gosto musical foi mudando. E mudava muito meu gosto nessa época (me refiro, é bom lembrar, aos anos 90). Houve uma época em que escutava música pop, dance e rock que rodavam na Gazeta FM, que na época tinha uma programação mais sofisticada, na linha do que hoje roda na 99,7. Depois passei a ouvir somente Rap e apaguei boa parte das fitas gravando por cima as músicas de discos de vinil que alguns amigos traziam de Porto Alegre ou então fazia cópias de fitas também oriundas dos LPs. Depois comecei a ouvir MPB e samba e mais uma vez desgravei boa parte do meu acervo. Ainda entraria até a metade da primeira década deste século gravando e regravando, não fosse a internet entrar nas nossas vidas com o formato MP3.

Hoje consigo pela web tudo o que ouvia naquela época, porém se perderam nas antigas gravações as seleções que fazia com muito cuidado, sempre prestando atenção nos nomes das músicas e bandas ditas pelo locutor para anotar nas capinhas. Às vezes, até deixava gravando a fala do radialista para anotar tudo, o que seria um belo registro histórico se depois não tivesse apagado tudo de novo. Acabei me tornando um expert nessas informações e os meus amigos volta e meia me pediam dados sobre alguma música que estava rodando na rádio.

Assim como as fitas, acabava apagando os dizeres das capinhas para substituí-los pelas novas músicas. Os rastros deixados se tornaram palimpsestos que deixam entrever minhas mudanças, minhas idiossincrasias, minhas incoerências. Meu ser é composto por essas incoerências. Não seria quem eu sou se não fossem as minhas incoerências. As minhas fitas K7 são apenas mais uma prova disso. Tudo gravado e regravado nas minhas fitas K7.

Cassionei Niches Petry – professor

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