“Acho que vi um gatinho”
[Devaneios crônicos]
Gosto muito de animais de
estimação. Aliás, gosto de animais de uma forma geral, inclusive de me
alimentar de alguns. Mesmo sabendo que eles podem sofrer quando são abatidos,
faz parte da minha natureza ser carnívoro, vem dos meus antepassados do tempo
das cavernas. É engraçado as pessoas se intitularem bondosas porque defendem os
direitos dos animais, muitas vezes apelando ao deus judaico-cristão, sendo que
esse deus poderoso, cujo nome sou obrigado a ouvir e ler todos os dias, pedia
sacrifícios de bichinhos inofensivos só para que esse mesmo nome ficasse cada
vez mais enaltecido. Está na Bíblia, ora!
Mas não devaneemos. Ou melhor,
sim, devaneemos, afinal, esse texto inaugura a seção do blog que se chamará
justamente devaneios crônicos. Cronicar, devanear e ganhar alguns leitores (e
perder outros tantos).
Volto ao começo. Disse que gosto
muito de animais de estimação. Por isso não os tenho. Quem tem algum bicho em
casa, deve cuidar dele, alimentá-lo bem, dar-lhe afeto. Não é o que vejo com
relação aos cachorros que rondam as ruas da cidade, atacando pessoas,
principalmente nossos eficientes carteiros, e rasgando sacos de lixo para se
alimentarem, não só de restos de comidas como também de fraldas e papéis
higiênicos usados. As ruas ficam sujas e os animais acabam transmitindo
doenças. Devido a isso, volta e meia aparece algum maníaco (ou melhor, não
aparece, porque se esconde, o covarde) que envenena os bichinhos. O melhor amigo
do homem passa a ser inimigo dele. Por que as pessoas não cuidam dos seus cães,
não os mantém dentro de seus pátios e não os alimentam como merecem? “Ora”,
direis, “manter os coitados presos!” Não presos e sim soltos, mas dentro dos
pátios. É para o bem deles. E nosso.
Se fosse para ter um bichinho de
estimação, teria um gato. Como sempre, porém, sou voto vencido aqui em casa,
pois a patroa e a minha pequena querem um cachorrinho. O gato é um ser
misterioso. Se os cachorros passeiam pelas ruas, os gatos preferem os telhados
e muros. Se vemos tudo o que os cachorros fazem (inclusive cenas
constrangedoras de sexo explícito), os gatos são mais discretos. Se sabemos os
passos dos cães, não sabemos os dos gatos. Por onde andam durante a madrugada,
o que fazem?
Imagino sempre um complô dos
bichanos, como numa das histórias de Neil Gaiman na série de HQ Sandman.
Em tempos remotos, os felinos governavam o mundo e dominavam os minúsculos
homens. Um líder dos homúnculos reuniu seus pares, incentivando-os a sonhar com
um mundo diferente. E conseguiram. Agora, é um líder felino que reúne na
madrugada seus pares e os exorta a sonharem com um mundo em que eles voltariam
a ser superiores.
Gosto muito de animais. Por isso
meu santo padroeiro, quando era católico, foi São Francisco de Assis. Acontece
que, muitas vezes, quando eu caminhava e algum cachorro se aproximava, eu
rezava para que o santo me protegesse. Nunca tive as preces atendidas e recebia
mordidas no calcanhar. Os gatos, por sua vez, me miravam de longe, com aquele olhar
peculiar de mistério, talvez pensando: “deixa estar, humano. Logo, logo serei
eu no seu lugar.”
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