Meu texto na página de opinião da Gazeta do Sul de hoje
Qual o caminho seguir?
Na minha adolescência, sempre ouvia uma frase que me dava um
norte político: não seja massa de manobra. Essa afirmativa se referia a um tal
de “sistema” que nos conduzia o pensamento, que nos cegava e nos guiava a seu
bel-prazer. O “sistema”, por sua vez era composto, entre outras coisas, pelo
governo e por uma mídia manipuladora. O governo, claro, era de uma ideologia reacionária
e a mídia, por sua vez, era formada pela Rede Globo, pela Revista Veja, pelo
jornal Zero Hora, enfim, pelos meios de comunicação que tinham interesses em
manter no poder os conservadores. Segundo, claro, aqueles que me diziam para
não ser massa de manobra.
Acontece que essa repetição de uma mesma frase tornou-se
algo verdadeiro, indiscutível. Quem não concordasse com ela era alienado, um
servo do sistema. Então, fazia de tudo para que minhas opiniões se encaixassem
dentro dessa ideia, tentando sempre ir contra o “sistema”, não me deixando ser
manipulado. Ora, mas será que não estava continuando a ser conduzido, porém por
outras forças que não o “sistema” e “a mídia manipuladora”? Ao guiar minhas
opiniões por conceitos pré-fabricados por uma ideologia de contestação, não
estaria ainda assim sendo parte de uma “massa de manobra”?
Hoje sou um “em cima do muro” assumido. Aliás, ser chamado
assim é algo negativo para muitos. Temos que escolher um lado e reproduzir as
opiniões dos que fazem parte deste lado, não importam se essas ideias vão de
encontro às nossas vontades individuais. Aliás, é também negativo pensar só em
si mesmo. Temos, dizem, que pensar na coletividade, aceitar o que diz nossa
categoria, falo aqui dos professores, deixarmos de ser egoístas e aceitar o que
diz a maioria.
Não, não aceito. O caminho que sigo não é o da maioria. O escritor
norte-americano Robert Frost escreveu um belo poema, cujo trecho foi
reproduzido pelo personagem de Robin Williams em “A sociedade dos mortos”: “Dois caminhos bifurcavam, e eu –/O menos pisado
tomei como meu/E a diferença está toda aí.” Sigo minha própria senda, que pode
ser a errada, e essa senda pode inclusive ser construída por mim mesmo. Mas por
que, ao invés de escolher um dos dois caminhos, eu não posso fazer um novo
entre os dois?
Humberto
Gessinger, líder da banda gaúcha “Engenheiros do Hawaii”, compôs: “Só um
caminho/a vida está cheia deles/meu destino eu faço/eu traço passo a passo”. A
música faz parte do seu disco solo, intitulado “InSULar”, simbolizando aquele
anda só, isolado, como uma ilha, dentro do sul, que é o seu lar. O mesmo Gessinger
escreveu, inclusive, uma letra que me serve como lema de vida: “Ando só, como
um pássaro voando/Ando só, como se voasse em bando”. É difícil viver entre as
pessoas e mesmo assim manter sua individualidade. Mas tento.
Reparem que,
mesmo para seguir o meu caminho, eu sigo o que outros escreveram. São escolhas,
porém, minhas. São poemas e músicas que me fazem tirar minhas próprias
conclusões ou então, simplesmente, me recolher a minha insignificância e não
concluir nada. Quando vejo manifestações contra ou favor de governos, quando
sou chamado a aderir a passeatas de protesto ou a parar de trabalhar como todo
mundo para reivindicar algo, me pergunto se devo me inserir dentro dessa massa.
Ao ver o que defendem os líderes dessa massa, no entanto, recorro a outro
poeta, o português José Régio: “Não sei para onde vou/sei que não vou por aí.”
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