Seguindo pistas filosóficas




Duas famílias em constante conflito não é novidade nenhuma na literatura. Aliás, nenhum tema o é. O que nos chama a atenção no romance de Marcos Peres, no entanto, é que os Klein e os Koch se digladiam por questões filosóficas. As mortes que ocorrem durante a narrativa podem ser motivadas, por exemplo, devido a críticas ao pensamento de Nietzsche. O filósofo alemão, diga-se, é o fio condutor de toda a trama. Pena que o delegado que investiga os crimes não o conhece muito bem.

Quem fim levou Juliana Klein? (Record, 352 páginas) é o e segundo romance de Marcos Peres. O primeiro, O evangelho segundo Hitler, já nos mostra um escritor que utiliza a intertextualidade sem parcimônia, a começar pelo título. Sou fã desse tipo de narrativa, principalmente se ela respeita a inteligência do leitor e não for muito daquelas didáticas que explicam a todo o momento as referências facilmente decifradas até pelo leitor experiente. Peres escorrega bem pouco nesse quesito, porém sem comprometer muito a história.

Duas professoras de filosofia que lecionam em Curitiba são assassinadas: Juliana Klein, da Universidade Federal do Paraná, foi morta em circunstâncias misteriosas no ano de 2008. Três anos antes, Tereza Koch, da Pontifícia Universidade Católica, fora assassinada pelo também professor de filosofia, Salvador Scaciotto, marido de Juliana, depois de uma palestra. Já em 2011, o delegado da cidade de Maringá, Irineu de Freitas, envolvido na investigação dos dois casos, retorna à capital paranaense, já que a irmã de Juliana Klein, Mirna Klein, também perde sua vida violentamente. A jovem Gabriela, agora com 15 anos, poderia ser a próxima vítima de uma briga familiar que remonta às décadas passadas e que se iniciou na Alemanha?

Nessas idas e vindas no tempo, o leitor pode se embaralhar bastante (o próprio autor acabou se descuidando e mencionou postagens de Facebook no ano de 2005, assim como colocou Juliana no júri que julgou seu esposo). Isso, no entanto, é o que nos atrai para dentro do enredo que sofre algumas reviravoltas, não deixando o interesse do leitor virar cinzas, como o corpo de Juliana Klein, cremado antes da conclusão da investigação.

O título pode nos deixar em dúvida sobre sua morte, assim como as citações filosóficas, principalmente de Nietzsche, também nos possibilita pensar em sua volta, principalmente as que se referem ao eterno retorno, tema de estudo da personagem. Logicamente, não darei aqui nenhuma resposta. Deixo a dúvida, e esse é um romance que nos deixa muitas dúvidas. E isso também me atrai como leitor.

“Se me explico, me implico:/Não posso a mim mesmo interpretar./Mas quem seguir sempre o seu próprio caminho/Minha imagem a uma luz mais clara também levará.” Este epigrama de A gaia ciência (livro que é uma das chaves do enredo), do Nietzsche, aqui na tradução de Paulo César de Souza, me aconselha a parar por aqui, pelo menos para não estragar a fruição de quem ainda não leu a obra de Marcos Peres. É um bom divertimento intelectual.

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