Notas de leitura sobre “Welcome to Copacabana e outras histórias, de Edney Silvestre
Dividido em três partes, “No Rio”, “Além do Rio” e “De volta
ao Rio”, a capital fluminense é o ambiente que molda os personagens, mesmo
quando estão distantes dela. E é a solidão na cidade populosa e maravilhosa que
permeia as primeiras narrativas de Welcome
to Copacabana e outras histórias, de Edney Silvestre (Record, 352 páginas).
No primeiro conto, que dá título à coletânea, a
protagonista, Regina, uma viúva e avó, “mulher madura”, como prefere, “não sou
velha, ainda falta algum tempo”, aguarda a virada do ano, cuidando as horas no
relógio do micro-ondas, enquanto relembra alguns fatos da sua vida,
principalmente a frustração de não conhecer Paris. Seus filhos não a visitam,
salvo para tratar de assuntos do espólio. Ainda assim, rechaça a companhia de
uma vizinha enxerida, e tenta se afastar de qualquer convívio permanente, indo
almoçar em restaurantes distintos. “Sou sozinha (...), não solitária.”
“Ben que olhava o trem” é um conto impactante desde o
início. Uma mãe que deixa o filho esperando à frente de uma borracharia
enquanto sobe num caminhão para vender seu corpo e poder comprar um prato de
comida frio para os dois. Para trás, havia deixado o corpo do companheiro, que
ela matara depois de pegá-lo abusando do enteado, numa cena violenta. Mais
cenas assim vão se sucedendo em poucas páginas, principalmente quando o menino
se vê só, até chegarmos a um desfecho imprevisível. Um conto que incomoda.
Solidão, amor fracassado e amor pago são temas de “O
universo não vale teu amor”, em que um professor de matemática projeta em uma
mulher na rua a Madeleine do filme Vertigo,
de Hitchcock. Há também aqui um final que impressiona.
Entre esses contos bons (e mais longos), aparecem algumas
histórias mais curtas que destoam um pouco da coletânea. Parece que o forte de
Edney Silvestre é o enredo mais desenvolvido, que não consegue condensar e
causar uma impressão boa no leitor. Fraca também foi a tentativa de realizar um
conto de ficção científica. Em “Zak”, o estilo fragmentado e o uso de fontes
diferentes não combina com a literatura de gênero, que rechaça
experimentalismos com a linguagem. Conto longo, porém o enredo não fica na
mente do leitor.
Edney Silvestre deixa como pano de fundo em muitas
narrativas as questões políticas e econômicas do Brasil. Um administrador que
lucra com as crises do país visita o sítio arqueológico de Paestum, na Itália,
em uma lua-de-mel com sua nova esposa, depois de um acordo de divórcio
milionário. A vingança de uma mulher “escanteada”, no entanto, e que não é tão
sonsa como parecia, aliada às pessoas certas, pode tirar toda a sua tranquilidade.
“Dentro da guerra” é uma comovente reflexão, em que uma
mulher que viu sua cidade sendo destruída conversa com um homem: “Uma guerra é
assim – ela ergue a cabeça do travesseiro, estende os braços para ajudar a
demonstrar. Quando, por assim dizer, o senhor está voltando para casa, voltando
da escola, e o senhor não consegue encontrar ela mais, a sua casa, porque o
quarteirão onde o senhor mora virou um monte de tijolos de muitos pedaços, com
neblina saindo de dentro”. Tema parecido é o do conto “Me tirem daqui”.
“Silvio trabalha” é a história de um garoto de programa
brasileiro que vive em Nova Iorque. Em “Noite no Texas”, um brasileiro, tentando
entrar ilegalmente no EUA, acaba entrando numa grande enrascada. “Apenas uma
mulher de negócios” retoma a personagem Regina, que apareceu em outros dois
contos, e fecha o livro com um enredo que retorna ao Rio depois de ter como
cenário várias partes do mundo. Um livro que faz jus ao lema: “ler é uma viagem”.
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