Aquele garoto em cima do muro
(Imagem da internet)
Tenho várias
opiniões sobre as eleições deste domingo, porém, como a minoria, resolvi
guardá-las para mim. Já dei uns pitacos nas redes sociais, mas devido à onda
raivosa que varreu a rede, dificultando e tornando um porre a navegação do
internauta, me contive e tentei não entrar em nenhum debate. Se fosse no tempo
do Orkut, talvez estaria até agora defendendo meus pontos de vista em uma “comunidade”.
Se fosse um pouco antes disso, final dos anos 90 e início dos anos 2000, iria
brigar com algum parente no almoço de domingo defendendo o direito de ter a
minha opinião (que hoje, sei, era totalmente equivocada).
Poderia escrever
nas redes algo como: “Votar no candidato A ou no candidato B ou optar em votar
em branco (que inclusive tem o direito a uma tecla na urna, não sei se vocês
viram) não é ignorância e sim um pensamento diferente. As pessoas não pensam da
mesma forma, as pessoas não são iguais, não pensam como você acha o correto
pensar. Ignorante é quem vê ignorância somente nos outros”. Ou: “Votar em
branco ou nulo também é um ato democrático. O que não é democrático é ser
obrigado a escolher quem você não quer”. Ou ainda: “Compartilhar literatura nas
redes sociais num dia como hoje [de eleição] é como gritar "vamos
ler!" num show de sertanojo primário ou pseudo-funk.” Ou: “Dica de um
professor: não é educativo dizer a alguém para não ler determinada revista ou
determinado jornal pelo fato de a publicação não estar de acordo com suas
ideologias. O mais aconselhável é dizer que se deve ler criticamente diversas
fontes e aí cada um formar sua própria opinião. Mas sei que dizer isso num momento
de cegueira partidária é uma perda de tempo.”
Essas postagens
foram a minha contribuição para o “não debate” político em 2014. Sim, as lancei
na internet naquele ano. Esta crônica, na verdade, foi escrita em 2014. Vivemos
o mesmo clima hoje. Desiludido com toda a política, a incoerência dos partidos,
dos partidários e mesmo dos eleitores sem partido, vejo tudo um pouco de longe
e pensando diferente. Sou mais ou menos o que Cazuza cantou em “Ideologia”. Sou
aquele garoto que queria mudar o mundo, foi de esquerda, flertou com a direita
e hoje vê tudo em cima do muro. Para muitos isso é um defeito, foi o que ouvi
de pessoas próximas. Vejo por outro lado, com meus olhos míopes. Em cima do
muro eu observo os dois lados e vejo suas qualidades e defeitos, vejo quem está
se engalfinhando, quem está planejando alguma maracutaia, quem está se unindo
para realmente resolver os problemas da população. É um olhar privilegiado, no
entanto não superior, que fique bem claro. Ainda bem que ninguém ainda está
querendo me puxar para voltar para o seu lado. Dou a mão para um e outro de vez
em quando, mas eles não querem subir e observar o outro lado. Preferem ficar
com o muro separando-os. Como o muro do Roger Waters.
Lembro-me agora da música “Pesadelo”, de Paulo
César Pinheiro e Maurício Tapajós, composta durante a ditadura militar: “Quando
um muro separa, uma ponte une”. O problema é que construímos mais muros do que
pontes.
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