DFW no Traçando livros de hoje
Na minha colaboração quinzenal com o jornal Gazeta do Sul, no caderno Mix, escrevo sobre David Foster Wallace: http://www.gaz.com.br/gazetadosul/noticia/377279-o_que_cabe_numa_nota_de_rodape/edicao:2012-11-07.html
³ Sigla pela qual é chamado por seus adoradores, o que nos leva a crer que logo vão querer dividir a literatura em antes e depois de DFW.
4 Com suas mais de mil páginas que estão sendo traduzidas por Caetano Galindo.
5A nota de rodapé é um recurso que serve para explicar, comentar ou acrescentar algo ao texto. Muito utilizado em textos acadêmicos. Costuma não ser lido pela maioria dos leitores. Na obra de DFW, a passagem mais interessante pode estar numa nota de rodapé.
6 “É tão moderno que parece habitar um contínuo tempo-espaço diferente do nosso. Maldito seja”, disse sobre DFW a escritora Zadie Smith.
7 Assim como esse, quase todos os ensaios têm títulos quilométricos, como o que dá título ao livro.
8 A história de Gregor Samsa, que acordou certa manhã e se viu transformado num inseto, o que inspirou uma banda brasileira dos anos 80 a criar uma obra-prima do pop rock brazuca: “Uma barata chamada Kafka”. Está bem, não é tão obra-prima assim, estou exagerando.
*Cassionei Niches Petry é professor, mestrando em Letras e escritor. Lançou seu primeiro livro, Arranhões e outras feridas (Editora Multifoco) – à venda na Livraria Iluminura –, aos 33 anos, idade em que DFW publicou seu grande romance, o que não quer dizer nada. Escreve quinzenalmente para o Mix e mantém o blog cassionei.blogspot.com.
O que cabe numa nota de rodapé?
Cassionei Niches Petry*
David Foster Wallace
nasceu em 1962, há 50 anos portanto, e morreu em 2008, ao se enforcar na
garagem onde escrevia seus livros. Foi um dos grandes nomes da literatura
contemporânea nos Estados Unidos e só agora começa a ser reconhecido no Brasil,
pois se tornou um escritor cult1
em todo o mundo após sua morte, assim como aconteceu com o chileno Roberto
Bolaño2.
DFW3 fez por merecer o reconhecimento. O romance Infinite Jest, publicado em 19964,
é considerado tão bom como Ulysses, de
James Joyce. Seus contos, reunidos em volumes como Breves entrevistas com homens hediondos, único livro lançado por
estas bandas, são exemplares de sua obra experimental. Metalinguagem, jargões
acadêmicos, criação de palavras, ironia, humor negro, enunciados enormes e grande
quantidade de notas de rodapé5, características do autor apontadas
pela crítica6, estão presentes no segundo livro lançado entre nós
.
Os ensaios, discurso de formatura e palestras reunidos em Ficando longe do fato de já
estar meio que longe de tudo (Companhia das Letras,
tradução de Daniel Galera e Daniel Pellizzari) mostram as investidas de David
Foster Wallace na não ficção. O autor, convidado por algumas publicações
jornalísticas a tecer suas impressões sobre diferentes eventos, reflete
filosófica e literariamente sobre um cruzeiro pelo Caribe, um jogo de tênis
entre Roger Federer e Rafael Nadal, uma feira agrícola no estado de Ilinois e outra
gastronômica no Maine. Nesta última, questiona sobre o sofrimento das lagostas,
fervidas ainda vivas para serem comidas: “A lagosta, em outras palavras, se
comporta mais ou menos como nos comportaríamos vocês e eu mesmo se nos jogassem
em água fervida (com a exceção óbvia de gritar).”
No texto “Alguns comentários
sobre a graça de Kafka dos quais provavelmente não se omitiu o bastante”7, Wallace faz uma palestra a respeito do humor
do autor de A metamorfose8. Seu texto mais famoso, no
entanto, é um discurso para a formatura do Kenyon College,
intitulado “Isto é água”. Espécie de texto de autoajuda, misturada com as
tiradas irônicas características de DFW, é uma excelente peça literária. Seu
início se assemelha a uma fábula: “Dois peixinhos estão nadando juntos e cruzam com um peixe
mais velho, nadando em sentido contrário. Ele os cumprimenta e diz: ‘Bom dia,
meninos. Como está a água?’ Os dois peixinhos nadam mais um pouco, até que um
deles olha para o outro e pergunta: ‘Água? Que diabo é isso?’”
Tudo para dizer que “a realidade mais óbvia, ubíqua e vital
costuma ser a mais difícil de ser reconhecida”, e que devemos ter “consciência
de que o real e o essencial estão escondidos na obviedade ao nosso redor”. Ou
seja, a velha história de que o indivíduo deve ser menos egocêntrico, para não “chegar
aos 30 anos, ou talvez aos 50, sem querer dar um tiro na própria cabeça”. É
preciso repetir que ele se enforcou aos 46 anos?
Ironicamente, não seguiu seu próprio conselho e pensou que
não precisava mais dos seus medicamentos antidepressivos. Na verdade, seu
discurso era um alerta aos alunos que o ouviam para não fazer o que ele fazia. No
livro da vida, além do texto principal, também devemos ler as notas de rodapé.
³ Sigla pela qual é chamado por seus adoradores, o que nos leva a crer que logo vão querer dividir a literatura em antes e depois de DFW.
4 Com suas mais de mil páginas que estão sendo traduzidas por Caetano Galindo.
5A nota de rodapé é um recurso que serve para explicar, comentar ou acrescentar algo ao texto. Muito utilizado em textos acadêmicos. Costuma não ser lido pela maioria dos leitores. Na obra de DFW, a passagem mais interessante pode estar numa nota de rodapé.
6 “É tão moderno que parece habitar um contínuo tempo-espaço diferente do nosso. Maldito seja”, disse sobre DFW a escritora Zadie Smith.
7 Assim como esse, quase todos os ensaios têm títulos quilométricos, como o que dá título ao livro.
8 A história de Gregor Samsa, que acordou certa manhã e se viu transformado num inseto, o que inspirou uma banda brasileira dos anos 80 a criar uma obra-prima do pop rock brazuca: “Uma barata chamada Kafka”. Está bem, não é tão obra-prima assim, estou exagerando.
*Cassionei Niches Petry é professor, mestrando em Letras e escritor. Lançou seu primeiro livro, Arranhões e outras feridas (Editora Multifoco) – à venda na Livraria Iluminura –, aos 33 anos, idade em que DFW publicou seu grande romance, o que não quer dizer nada. Escreve quinzenalmente para o Mix e mantém o blog cassionei.blogspot.com.
Comentários
Li que o Galera, um dos tradutores deste livro, em seu novo livro, também passou a usar às fartas tal artifício.
Gruda que ném chiclé?
Eu não gosto de notas de rodapé nem mesmo em texto acadêmico. Acho que tudo pode estar inserido no texto principal.
Aliás, o Galera está onipresente e onipotente nos jornais de hoje.
Se tivesse o tempo que ele teve pra se dedicar à escrita do romance, e com adiantamento financeiro, escreveria um com mais de 400 páginas. Não é questão de covardismo.
Mas me fez lembrar de uma frase de Cortázar: "gênio e apostar-se gênio e acertar".
E me esclareça uma coisa, se o sujeito não se acha o tal, qual o propósito dele escrever?
Quando eu era pequeno, eu era o gênio da escola, pois entrei nela sabendo ler. Mas depois fui tomando tanta pancadada, desprezo e silêncio, que eu me recolho a certa insignificância. Mas é claro que, no fundo no fundo acredito no que faço, mas não cabe a mim dizer isso.
Cortázar... e pensar que tem uns aí que não o consideram um grande escritor.