As luzes se apagam



Quando fiquei sabendo da morte do compositor Aldir Blanc, vítima da Covid-19, me veio à mente que uma das bússolas que me guiam se quebrou. Os artistas (músicos, cineastas, escritores) e filósofos que ouço, vejo ou leio são meus guias. Aldir Blanc foi guia de várias gerações, principalmente durante a ditadura no Brasil. Basta lembrar a canção “O bêbado e o equilibrista”, de uma rica parceria com João Bosco.

A bússola é um objeto que nos situa quando estamos perdidos, indicando com uma agulha onde fica o Norte. Por isso dizemos que algo nos norteia ou, ao contrário, quando não encontramos um rumo, estamos desnorteados.

Também para nos guiar podemos olhar para onde nasce o sol, que é no leste, também chamado de oriente. Por isso as palavras orientação e desorientação. Desorientados estamos, em meio à pandemia. Mas buscamos uma luz, como a planta que no escuro busca um facho de luminosidade, o inseto que busca uma lâmpada acesa ou mesmo a chama de uma vela, onde acaba morrendo (nem sempre luz é vida). Podemos lembrar também o clichê da luz no fim do túnel, que todos estamos buscando. Há ainda o farol, que orienta os navios. Quem seria o farol para guiar a nau perdida que é o nosso país? “O Brazil não merece o Brasil / O Brazil tá matando o Brasil”, escreveu Aldir em “Querelas do Brasil”.

Símbolos e metáforas à parte, vivenciamos uma proliferação de um vírus, um inimigo invisível, e não sabemos se vamos nos livrar dele. Não há perspectivas próximas, apenas uma leve esperança do otimista. O pessimista, por seu turno, não vê boas notícias para os próximos anos. O cético, num meio termo, duvida de soluções fáceis, mas não descarta que há possibilidade de estarem nesse exato momento descobrindo a vacina.

Em “Resposta ao tempo”, cujo parceiro na melodia foi Cristovão Bastos, Aldir Blanc escreveu que o tempo “sabe passar e eu não sei”. O tempo passa e não sabemos lidar com isso. Não vemos a solução desse enorme problema num curto espaço de tempo. A angústia aumenta, a incerteza nos assola e apenas a arte nos dá um alento, já que os líderes não assumem o papel de nos conduzir, importando-se apenas em manter o poder.

Quando mais precisamos de líderes, o eleito é um farol queimado e seus opositores sãos as pedras que apenas querem destruí-lo. Como na letra de Blanc, “Incompatibilidade de gênios”, os opostos não se bicam: “Um cisco no olho, ela em vez de assoprar / Sem dó / Falou que por ela eu podia cegar”.

Morreu Aldir Blanc, cronista e poeta de um país em que as mortes são só números (“Tá lá o corpo estendido no chão”). E daí?

(Cassionei Niches Petry – professor e escritor)

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