Justificativa aos “patrões”

(texto enviado ao jornal Zero Hora)

Na Zero Hora do último domingo, um dos leitores que opinaram sobre o editorial que abordava a qualidade de ensino, critica os professores por estarem sempre de folga e tirarem três meses de férias. Cabem alguns esclarecimentos para “iluminar” cérebros que vivem ainda na Idade das Trevas.

Em primeiro lugar, essa “folga” dos professores é ocupada por preparação de aulas, correção de provas e, no meu caso, redações, além de leituras de jornais, revistas, sites e demais fontes que nos mantêm bem informados e preparados para entrar na sala de aula. O professor não sai da escola e volta só no outro dia, retomando o trabalho de onde parou. Ele não está comprometido com dados arquivados no computador, mas sim com crianças e adolescentes que não são máquinas. Querer comparar com outras profissões é uma falta de ética, pois essas mesmas pessoas que criticam sem razão não gostariam de ver seu trabalho questionado por quem não conhece a realidade de cada profissional.

Quanto às férias, a rigor temos 30 dias, como todas as outras profissões. Os demais dias, no entanto, são considerados recessos, que acontecem por diferentes motivos: em julho, é um descanso não só para o professor, mas para o próprio aluno, pois o estudo envolve uma atividade intelectual desgastante para a mente da criança. Qual pai que gostaria de ver seu filho sem vontade para nada já na metade do ano? Do final de dezembro até meados de janeiro, há outro recesso, mas o professor deve estar à disposição para qualquer eventualidade, como revisão de provas, por exemplo. De meados de janeiro há meados de fevereiro, acontecem as férias, sendo que voltamos ao trabalho na semana anterior às aulas para palestras e outra atividades preparatórias para o início do ano letivo. Além disso, só há esse tempo todo de pausa devido ao veraneio, sendo que há pais que só podem sair de férias no primeiro mês do ano e outros no segundo. Há ainda o interesse do comércio no litoral. Se houvesse somente um mês de férias para os alunos, as consequências seriam enormes.

Nesse tempo todo, é bom salientar, o educador não está exatamente parado. O professor de Português, por exemplo, continua lendo, escrevendo muito e estudando as mudanças ortográficas. O professor de História pesquisa e relê sobre os fatos históricos, bem como assiste aos noticiários, afinal de contas os fatos que estão acontecendo agora serão comentados em sala de aula. O professor de Geografia, por seu turno, está acompanhando atentamente a tragédia nas serras do Rio de Janeiro, pois será questionado pelos alunos sobre isso. Cada profissional da educação, mesmo quando diz que quer esquecer um pouco o trabalho, acaba sempre, cada um do seu modo, estudando e se atualizando, pois sabe que enfrentará centenas de jovens antenados com as novas tecnologias.

Para terminar: os pais não são os únicos patrões de quem trabalha na esfera pública. Todos pagamos impostos. Portanto, quem decide sobre os rumos da educação e quem deve buscar melhorar o ensino somos todos nós.

Cassionei Niches Petry - professor

Comentários

charlles campos disse…
Excelente argumentação e defesa de uma profissão tão alvo da boçalidade alheia, Cassionei. Tenho grandes amigos professores, mas apenas um tem o esclarecimento e a cultura que vejo em vc, e a preocupação de, utilizando a atualização constante destas qualidades, procurar retirar parte dos alunos que se interessam da alienação e inércia cerebral. Já fui professro por dez anos, e sei do que vc fala. Se fosse uma profissão regularizada _ e não vítima do imenso aviltamento nacional _, os professores deveriam sim ter mais tempo livre e mais férias reais, pois o suor despendido por vcs não está apenas na sala de aula, mas nas intensas horas de preparamento que se faz off-escola.

Abraços.
Cassionei Petry disse…
Obrigado por comentar, Charlles.

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