Germano e a universidade
Germano, nosso homem do interior
de uma cidade do interior do estado, decidiu conhecer a universidade onde seu
filho estuda. Quando ele passou no vestibular, a festa foi muito grande, afinal
era o primeiro da família que ia cursar o ensino superior. Um acontecimento.
Por isso, naquele mês, não gastou parte de seu dinheiro vendo as bolsas das
mulheres na cidade, muito menos com as moças atenciosas das janelas.
Pois no mês seguinte, depois de
rever os amigos no calçadão do centro e dar uma passadinha para visitar as
amigas da Rua Venâncio Aires, dirigiu-se à faculdade para, enfim, conhecer
aquele centro de sabedoria. Alguns amigos diziam: “olha, lá é um lugar de
estudos, muito silencioso e, quando toca música, é só clássica ou MPB. Não sei
se tu vai te sentir bem por lá. Os jovens estão sempre lendo, coisa incomum de
se ver por aqui. Lá é outro mundo, o mundo dos estudos”.
Pegou o ônibus e se foi para as
bandas da universidade. Será que iria encontrar seu filho por lá? Que orgulho,
seu filho no meio de pessoas tão inteligentes.
Mal chegou e estranhou o número
enorme de gente fora da sala de aula. Se perguntou se as aulas não haviam
iniciado ainda ou havia uma atividade extraclasse. Estranhou também ao ver os
carros, muitos por sinal, passando com o som no último volume, tocando música
sertaneja, pagode e funk. No chamado Centro de Convivência, um DJ tocava o
maior sucesso do momento, o tal do Michel Teló. Agora entendia porque chamavam
aquele tipo de música de sertanejo universitário. Também não viu nenhum aluno
lendo livro. Nas mãos dos estudantes, latinhas de cerveja ou outras bebidas.
Definitivamente havia errado de endereço. Ou os amigos estavam brincando com ele.
Qual não foi a surpresa maior do
nosso Germano ao ver seu filho conversando com uns amigos e bebendo cerveja. Olhou
tristemente para o rapaz e foi em sua direção. Com muita raiva, derrubou a
cerveja da mão do filho e disse que ele deveria estar estudando. Não estava
ajudando a pagar as mensalidades para vê-lo ali bebendo.
O rapaz, envergonhado, pediu para
o pai parar com aquilo, pois estava passando vergonha. Germano, ainda bufando,
disse que iria embora decepcionado. Pensava ver o filho estudando, lendo,
dedicando-se a construir uma carreira e sair do interior.
Até que um amigo se meteu na
conversa: “olha, o que posso dizer para o senhor é que há novas ideias
pedagógicas ensinando que todos os momentos aqui dentro são momentos de
aprendizagem. Veja bem: agora há pouco conversávamos sobre como a filosofia
aborda a complexidade do sujeito no que se refere aos seus desejos. Para
exemplificar, compramos estas latas de cerveja e comprovamos, num primeiro
momento, que basta querer e o sujeito consegue ter o objeto dos seus desejos.
No entanto, ao esvaziarmos o conteúdos das latas, verificamos que a conquista pode
terminar. Depois, basta desejar mais uma vez e buscar realizar esse desejo, que
mais uma vez se consegue. Porém, mais uma vez a conquista tem seu fim e assim ad infinitum.
Germano gostou muito de saber que
os amigos do seu filho sabiam até latim, só não entendia essas novidades na
educação. Beber cerveja, então, fazia parte do currículo escolar? “Hum”, pensou
Germano, “acho que vou voltar a estudar.”
Leia também as outras crônicas sobre o Germano: Germano e as calcinhas e Germano e as bolsas.
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