Para isso escrevemos
Recebi um e-mail de um professor de Minas Gerais. Pedi que ele autorizasse a publicação aqui nesse espaço, pois retornos como esse servem de motivo para continuar escrevendo:
Caro colega professor Cassionei
Entenda este mail como uma singela forma de agradecimento pela
publicação do seu ótimo texto "Aula Chata é Legal", que encontrei ao
acaso na internet! Tomei a liberdade de publicá-lo, com referência, numa
página do Facebook criada por ex-alunos da instituição onde trabalho em
ocasião de uma festa de egressos (http://www.facebook.com/groups/142916845835880/ ).
Nesta festa, me senti muito aborrecido com uma ex-aluna que disse que
atualmente (anos depois de sido minha aluna), ao namorar um arquiteto,
percebeu o quanto era bom o conteúdo do que eu passava em sala de aula,
apesar das minhas aulas serem chatas e maçantes (sou professor de
História da Arte para Ensino Médio Técnico). Depois de umas cervejinhas,
fiquei meio sem saber o que falar na hora.
Minhas aulas são realizadas em um ateliê construído ao longo de anos e
anos, edificado com muita luta dentro de uma escola essencialmente
tecnológica, onde boa parte dos colegas são engenheiros disso ou
daquilo, sendo que muitos destes enxergam a arte (e algumas outras
disciplinas humanas) como um dispensável acessório. Faço uso
didaticamente de muitas imagens da História da Arte, projetadas em
tamanho gigante por um data-show, trechos de documentários de canais
como Discovery, History Channel e NGC (isto é, bem dinâmicos),
distribuição de pôsteres de quadros famosos, explicação do significado
de cada um deles, aulas práticas envolvendo os temas (pintura, desenho,
mosaico, teatro (paródias de mitologia grega) etc. Além do mais, costumo
fazer convênio com o cinema de minha cidade quando este exibe películas
que de alguma forma estejam relacionadas com os meu conteúdos - filmes
como "O Código Da Vinci", "Tróia", "Cruzada", "Rei Arthur",
"Alexandre"...). Os ingressos são vendidos com desconto no próprio
colégio. Tanto antes, quando depois do filme, os alunos são inseridos no
universo de seus enredos, onde procuro destacar as partes relacionadas à
História da Arte. Ainda ocorre, ocasionalmente, visitas ao MASP, Bienal
de S. Paulo e afins, que é algo meio complicado, visto que moramos em
Minas, a mais de 10 horas de viagem da capital paulista.
Mas é claro que em alguns momentos, na verdade, em boa parte deles, eu
tenho que dar uma aula tradicional, escrevendo (ou desenhando) no
quadro, ou falando de política do Egito, da Grécia ou da Roma Antiga
(para justificar estilos de arte), ou me delongando no espírito
humanista do Renascimento, ou tentando explicar o que havia por trás do
Modernismo. Isto é, como vc disse em seu belíssimo texto, há momentos
que aulas são chatas porque o mundo não é necessariamente algo
"não-chato".
Atualmente faço
doutorado em Ciências Sociais. E neste, muitas aulas que assisto, são
extremamente chatas e lineares. Mas vejo que não tem que ser de outra
forma. Certo professor, que é cientista político, estudou por dez anos
"O Príncipe". Aprendeu italiano especialmente para ler quase tudo que
Maquiavel teria lido, só para entender ao máximo as entrelinhas de sua
obra, que também leu em italiano. Sua aulas então são ótimas, mas às
vezes cansativas. Sem que ninguém o questione quanto a isto, ele mesmo
diz que não há outro jeito. Não tem como resumir e fazer uma
apresentação de Powerpoint. Não tem como ficar contanto piadas sobre
isto (embora vez por outra, naturalmente algumas tenham surgido). E
quando o negócio está complicando, ele dá uma pausa para a gente tomar
um cafezinho (as aulas são depois do almoço!). E mesmo assim, nós
gostamos das aulas e vemos nelas sua importância para o nosso
aprendizado.
Concluindo, para
que este e-mail não fique "chato", o seu texto foi iluminador porque
demonstra que não precisamos ser circenses para dar uma boa aula . Foi
mais um desabafo com um colega que com certeza compreende minha
indignação. De certa forma, seu texto organizou o que a minha mente já
sabia, mas que não conseguia expressar com clareza. Se eu for no próximo
encontro de egressos, já saberei o que dizer.
Muito obrigado.
Edilson R. Palhares
Professor do CEFET-MG de Araxá
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