Sejamos mascarados - Jornal Gazeta do Sul

 


Sejamos mascarados


A máscara hoje faz parte do nosso dia a dia. Não devemos sair de casa sem ela. Se não for pela nossa saúde, pelo menos por respeito aos demais. Somente idiotas se recusam a usá-la. É que os idiotas cada vez mais fazem questão de demonstrar que o são. Gostam de pagar mico. “Ah, ninguém me bota focinheira”, diz aquele que usa coleira onde se lê a palavra “mito” bordada. Talvez prefira a máscara de oxigênio no hospital.

Na verdade, sempre usamos máscaras, sejam físicas, para proteção no trabalho e até para diversão (pelos profissionais da saúde, soldadores, pintores, apicultores, tatuadores, dedetizadores, mergulhadores, nas festas à fantasia, carnaval, etc.) ou simbólicas (a máscara do funcionário que está sempre sorrindo por fora, a do bom pai ou filho, do ator que interpreta seu papel numa novela, etc.). É uma relação entre ser e parecer. Quem somos e quem devemos parecer que somos. Não é necessariamente falsidade, no sentido pejorativo de ser mascarado, mas sim no sentido de conviver em sociedade, ou seja, respeitar as convenções para a vida seguir. A máscara social é necessária. “Na vida, precisamos sempre usar máscaras, pois ninguém nos reconheceria se nos apresentássemos de rosto nu”, escreveu o poeta Ledo Ivo.

Um tipo de máscara (prosopon) figurava os personagens nas tragédias e comédias gregas. Era usada por um ator que assumia mais de um papel nas peças, ou seja, várias personalidades. O ator finge ser outras pessoas, mente para o espectador que entra no jogo e finge acreditar no que assiste. É uma mentira válida, que nos ajuda a viver. As tragédias justamente mostravam o lado sórdido, violento, vingativo do ser humano. Através da catarse, “a purificação dos sentimentos através do terror e piedade”, segundo o filósofo Aristóteles, se aprendia a entender as angústias do mundo e poder sobreviver a elas.  

Sou contra determinados tipos de máscaras, como a dos assaltantes e assassinos, dos manifestantes que as usam para poderem fazer baderna, depredar prédios públicos ou particulares, e dos terroristas, como os religiosos fundamentalistas que gravam vídeos decapitando os que eles consideram infiéis e hereges. São covardes que se escondem para prejudicar o outro. Assim como a máscara do cara de pau, do político que é corrupto, que mantém o poder em benefício próprio. Para nossa sorte, às vezes as máscaras caem.

Paradoxalmente, “usar uma máscara inebria e liberta”, segundo Roger Caillois, apesar de algumas nos causar desconforto para respirar. Ela pode libertar a personalidade numa festa, fazendo o indivíduo “se soltar”, pode provocar prazer em quem tem fetiches, permite que um espírito se manifeste numa manifestação religiosa. Mascarar-se sempre fez parte do ser humano. Qual é a sua máscara, leitor?

 Cassionei Niches Petry – professor 


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