Diário crônico XI – Professor bom é o macaco de auditório
Sala
de aula no Japão. Década de 40. A chegada do professor é anunciada e os alunos
respeitosamente levantam-se de suas classes e fazem a reverência ao mestre. Ele
se posiciona atrás de sua mesa, em meio à fumaça de cigarro que ficou no ar.
Repreende os alunos por isso, mas aproveita para brincar com a situação,
dizendo que também gostaria de fumar. Após alguns risos, anuncia que, depois de
mais de 30 anos em sala de aula, vai se aposentar e dedicar-se a carreira de
escritor, pois os seus livros estão obtendo uma boa venda. Seus alunos, inconformados,
afirmam que mesmo assim continuará sendo o mestre deles, assim como continua
sendo dos seus pais, que o chamam de ouro maciço, uma barra de ouro sem impurezas.
Esse
é o início de Madadayo, derradeiro
filme de Akira Kurosawa, um dos maiores diretores da história do cinema.
Lançado em 1993, traz a história de Hyakken Uchida, adorado e respeitado por
seus alunos os quais o visitam regularmente depois de sua aposentadoria. É um
dos tantos filmes cujo protagonista é um professor e dos poucos em que ele é
respeitado desde o início, não apenas no final, depois conseguir conquistar e
agradar o aluno após várias situações de conflito.
Ontem
assisti a um vídeo real compartilhado nas redes sociais em que um aluno nos
Estados Unidos, ao ser convidado a ser retirar da sala de aula, faz um discurso
contra a professora. Cabelos ao vento ao melhor estilo Axl Rose nos anos 90, o
jovem dispara sua indignação por não estar aprendendo nada, acusa-a de ficar
sentada o tempo todo e apenas os manda ler e ler. E ele, vejam só, gostaria de mostrar
a ela como se ensina.
Não
sei o que realmente acontecia na sala de aula, portanto não posso dizer se a
professora realmente não ensinava. Ela tem, me parece, um estilo europeu de
didática, algo que vejo em palestras e aulas de mestres e doutores estrangeiros
que aportam por estas bandas. Sentam-se, puxam de suas pastas um texto e o leem
de forma pausada, chata para os nossos padrões, mas enriquecedores do ponto de
vista do conteúdo. O escritor Enrique Vila-Matas faz suas conferências dessa
forma e depois elas são reunidas em livro.
Pois
o aluno, inclusive de nível superior, quer um showman a sua frente e pouco se
importa com o conhecimento transmitido. E recebe apoio das novas teorias educacionais
que afirmam ter passado a era do professor transmissor de conhecimento e que o
aluno pode saber mais do que seu mestre.
Dos
comentários ao vídeo, todos eram de apoio ao rapaz. Ele a teria humilhado e ela
mereceu. Aquela velha história: o professor deve tornar as aulas atraentes,
deve ser um macaco de auditório (aliás, está na moda falar de macaco, como escrevi
no último diário crônico). É a vitória das teorias que apontam o mundo do
jovem, mesmo com pouca idade, poucas leituras, pouco conhecimento de mundo,
como mais importante do que o conhecimento acumulado na história da humanidade.
Comentários